Aos 17 anos, a estudante alagoana Maria Eduarda Andrade tomou uma decisão política: não tirou seu título de eleitora para votar nas eleições de outubro. O motivo não foi esquecimento ou preguiça. A atitude foi pensada e refletida durante um bom tempo, e discutida dentro de casa.
A adolescente aproveita as horas livres de estudos para manter um perfil no Instagram com dicas e motivação para outros vestibulandos, mas também procura se informar pelos veículos de comunicação tradicionais. Ela diz que visita sempre os portais de notícias e sites de jornais e revistas, apesar de não seguir nenhum deles em suas redes sociais ou no YouTube, onde diz gostar de videoaulas sobre biologia e literatura, além de canais sobre curiosidades e comportamento.
Eduarda representa uma parcela de adolescentes que, com 16 ou 17 anos em 2018, têm direito ao voto facultivo nessas eleições. Integrantes de uma geração que nunca viu o mundo sem internet, eles são quase 6,5 milhões de jovens hoje, mas só pouco mais de 1,4 milhão (ou 21,6%) tirou o título neste ano, segundo dados divulgados neste mês pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Será a menor participação dos adolescentes nas eleições presidenciais desde 2002.
Segundo eles, a queda de participação não pode ser vista de forma isolada do contexto social dos diferentes períodos eleitorais, e os motivos principais que podem ter afastado mais adolescentes das urnas incluem a falta de perspectivas por causa da crise atual e uma desconexão entre candidatos e eleitores jovens.
Para Rennó, da UnB, a constante diminuição do número de jovens eleitores demonstra uma insatisfação significativa de parte da sociedade com o sistema político. “A avaliação dos políticos piorou muito. O grau de desinteresse também aumentou. Há uma sensação de desalento da população em relação à política nacional”, explica ele.
Márcia Dias, da Unirio, diz também que, nos períodos em que ocorre na sociedade uma desilusão com a democracia e com seus agentes, os jovens são os que mais se alienam politicamente.
Os dados mostram que, um ano após as “jornadas de junho”, o número de adolescentes interessados em exercer o direito facultativo ao voto caiu 26,9%, enquanto a população total de 16 e 17 anos cresceu 2,4%. Entre 2014 e 2018, essa variação foi negativa em ambos os casos, mas duas vezes pior entre o eleitorado dessa faixa etária:
Minoria entre os adolescentes de sua idade, o estudante paulista Vinícius Figueira Armelin, de 17 anos, fez questão de tirar seu título e participar das eleições de 2018 mesmo sem ser obrigado.
Medalha de prata na Olimpíada Internacional de Química, realizada neste ano na República Tcheca, o morador de Valinhos afirma que entende o ponto de vista de quem não quer votar, mas considerou o peso e a importância de seu voto.
Uma pesquisa coordenada por Antonio Barros para identificar como os partidos atraem o eleitorado jovem mostrou que a atuação dos partidos na internet é eficaz para atrair a militância, mas ainda ineficiente na hora de dialogar com jovens que não sejam engajados politicamente.
“Um dos focos das legendas no ambiente virtual é a oferta de cursos online de formação política para jovens filiados e militantes, com vista à formação de novos quadros e à futura renovação política das legendas”, explica Barros. Segundo ele, todos os partidos treinam seus líderes jovens para atraírem novos jovens usando as redes sociais.
A alagoana Maria Eduarda afirma que não segue nenhum político nas redes sociais e que os posts que vê mostram uma “clara estratégia de marketing”.
“Eles ainda estão muito distantes dos jovens, da nossa realidade, do nosso cotidiano, porque realmente não se envolvem em nossas causas e quando se envolvem, é algo tão superficial”, diz a adolescente, para quem os candidatos jovens que se candidataram pela primeira vez também não servem, porque suas propostas parecem seguir o mesmo formato dos tradicionais.
De acordo com Barros, pesquisas recentes sobre juventude e política mostram que os jovens que não estão engajados em partidos valorizam cada vez menos a política formal, pela via partidária.
Mesmo entre os jovens que já votam, Márcia Dias afirma que esses sinais de frustração dos eleitores com a política brasileira podem se traduzir em um aumento no número de votos brancos e nulos, além da taxa de abstenção, que já bateram recorde em 2014.
Rennó aponta que a distância entre a linguagem tradicional dos políticos e a dos jovens exige abandonar estratégias que funcionavam há oito anos, mas não servem mais. Na visão dele, há candidatos tradicionais que ainda não conseguiram capitalizar em cima de mídias sociais, uma ferramenta em que, diz ele, apenas os candidatos com menos tempo de TV ou poucos recursos do fundo eleitoral têm investido.
Para Vinicius Armelin, mesmo com a falta de identificação dos jovens com os candidatos, ainda é importante votar. “Todo mundo quer um Brasil melhor. Então, se você realmente quer isso, tem de ir votar. É algo que é importante, é nossa forma de participar do poder político e buscar um Brasil melhor”, diz o adolescente.
Já Maria Eduarda acabou optando por esperar até as eleições de 2020 para estrear nas urnas, justamente por não se sentir representada com as opções de 2018.
Com informação do G1