Cerca de 46 fósseis de dinossauros e outros animais que habitaram o território brasileiro há mais de 100 milhões de anos e foram levados de forma ilegal para a França, deverão retornar ao Brasil. A pedido do Ministério Público Federal, a Justiça francesa determinou a repatriação do material, entre os quais está um esqueleto quase completo de dinossauro encontrado no sertão brasileiro.
Entre os materiais a serem devolvidos estão pterossauros, tartarugas marinhas, aracnídeos, peixes, répteis, insetos e plantas, alguns com milhões de anos. O pedido de devolução é resultado de investigação realizada pelo MPF em Juazeiro do Norte (CE), após denúncia de que fósseis brasileiros estavam sendo anunciados em página de comércio na internet. Ao todo, o material está avaliado em quase 600 mil euros, aproximadamente R$ 2,5 milhões.
A decisão que determinou a busca e apreensão dos exemplares e sua imediata devolução ao Brasil, foi tomada pelo Tribunal de Grande Instância de Lyon, na França, e comunicada às autoridades brasileiras no início do ano.
Entenda o caso
No final de abril, a Secretaria de Cooperação Internacional (SCI) do MPF encaminhou ao Ministério da Justiça, que é a autoridade central para esses temas, ofício solicitando à Justiça francesa autorização para realizar vistoria do material. O objetivo é avaliar os cuidados necessários para o transporte das peças ao Brasil e calcular o valor do traslado, que será custeado pela Universidade Regional do Cariri (URCA), responsável pela gestão do Geopark Araripe, situado no sul do Ceará. A área, que reúne importante registro geológico do período Cretáceo, é reconhecida pelo Unesco como o primeiro geoparque das Américas.
Além dos 45 fósseis que já retornarão ao Brasil, há um esqueleto quase completo de pterossauro da espécie Anhanguera com quase quatro metros de envergadura que também integra o pedido de repatriação. O fóssil originário da Chapada do Araripe, localizada na divisa dos estados do Ceará, Piauí e Pernambuco é o único que ainda aguarda julgamento de recurso, previsto para junho. Foi justamente esse esqueleto que deu início à investigação conduzida pelo procurador da República em Juazeiro do Norte (CE) Rafael Ribeiro Rayol. Retirado ilegalmente do país entre as décadas de 1980 e 1990, o fóssil estava sendo leiloado no site americano eBay por cerca de 250 mil dólares (quase R$ 1 milhão). De acordo com o anúncio, ele estaria localizado em Charleville Mèzières, na França.
O anúncio chamou a atenção da paleontóloga Taissa Rodrigues, que estuda essa espécie de dinossauro, e acionou o MPF. As investigações demonstraram que o espécime estaria sob posse de cidadão francês proprietário de um dos maiores laboratórios de reparação e reconstituição de fósseis daquele país, localizado em Lyon. Ele é suspeito de participação em grande esquema de exportação ilegal de fósseis brasileiros, investigado no Brasil e na França. Segundo o procurador da República Rafael Rayol, responsável pela investigação, foi o pedido de auxílio jurídico feito à França para a busca e apreensão desse pterossauro que levou as autoridades francesas a descobrirem outros fósseis retirados ilegalmente de vários países, inclusiv e os 45 que retornarão ao Brasil.
A confirmação dos exemplares da espécie Anhanguera, até então catalogada apenas na região da Chapada do Araripe, no Brasil, foi possível graças à análise de professores da Fundação Universidade Regional do Cariri (URCA) e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), mediante requisição feita pelo MPF. Após análise da descrição e de fotografias, foi confirmada a origem dos exemplares de pterossauro com base no aspecto tridimensional que os ossos fossilizados apresentam. De acordo com a análise, as rochas da unidade estratigráfica Santana, de onde os pterossauros foram retirados, se formaram há aproximadamente 110 milhões de anos, o que ajudará a estimar a idade real dos fósseis.
A paleontóloga Taissa Rodrigues, responsável por levar o caso ao conhecimento do MPF, comemorou a notícia de que os fósseis estarão, em breve, de volta ao Brasil.
Vemos no dia a dia as dificuldades para a repatriação desse tipo de material. Celebramos, pois era um patrimônio brasileiro que podia ter ido parar na casa de uma pessoa, perdendo todo o seu valor cultural. Provavelmente ficaria pendurado em uma parede como peça decorativa e não como objeto de valor científico e cultural para o Brasil. Com o retorno do material, um estudante brasileiro, por exemplo, poderá de fato estudar esse material, o que nos deixa muito feliz, afirmou.
O MPF mantém contato permanente com o Ministério da Justiça, o Itamaraty, o Instituto Chico Mendes, a embaixada do Brasil na França, entre outras instituições, para viabilizar o retorno do material.