Poucos candidatos à Presidência da República gostariam de estar na pele da pré-candidata da Rede Sustentabilidade Marina Silva. Sem alianças com outros partidos, uma bancada reduzida que garante somente dez segundos na campanha televisiva e apenas R$ 10 milhões do fundo eleitoral (menos de um quarto do que gastou na eleição de 2014), Marina, mesmo assim, com 15% das intenções de votos, atrás apenas do deputado Jair Bolsonaro (PSL), mostrou-se como a única capaz e vencê-lo no segundo turno – de acordo com a última do Instituto Datafolha, por 42% a 32%.
Cativar eleitores é um objetivo que, em sua equipe de campanha, é perseguido com estratégias diferentes — e, muitas vezes, opostas. Há um grupo mais fiel a Marina, egresso de sua primeira campanha em 2010, formador da Rede, que, como ela, rejeita qualquer ligação com partidos tradicionais e prega uma “nova política”. Diz não se importar com o pouco tempo na televisão ou a falta de dinheiro. E há um grupo focado em demonstrar que Marina tem os pés no chão, especialmente na área econômica, como em 2014.
A dialética entre os “sonháticos” e os “pragmáticos” da campanha ficou mais clara nos últimos dias. Depois que Marina e seus mais próximos rejeitaram com veemência os acenos feitos pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, os economistas Eduardo Giannetti da Fonseca e André Lara Resende, colaboradores que andavam meio distantes, apresentaram publicamente diagnósticos e propostas econômicas.
“Isso mostra que a Marina tem na área econômica uma equipe de pessoas com experiência e que não vai fazer nenhuma aventura política na economia”, diz Giannetti, que defende propostas de uma economia de mercado com uma política inclusiva “incisiva”.
Para Giannetti, a eleição se apresenta com dois candidatos de extremos, caracterizados pelo caráter belicoso: Bolsonaro e Ciro Gomes (PDT). Ele afirma que a movimentação é uma forma de indicar que Marina irá se apresentar como a candidata da racionalidade.
Dificuldades para atrair nomes de peso
Ao lado do economista Ricardo Paes de Barros, um dos maiores especialistas do mundo em programas focados na população de baixa renda, Giannetti e Lara Resende são os sinais ao mercado e ao público de que Marina irá, sim, abrir espaço a ideias semelhantes às defendidas por PSDB e PT. Enquanto isso, seu grupo mais fiel zela por afastar a possibilidade de isso se concretizar no quesito aliança partidária.
Até aqui, Marina e os seus correligionários demonstram muita dificuldade e pouca disposição para atrair partidos de peso. Marina tem investido em conversas com partidos nanicos, como PHS e PMN, e sonha com o apoio formal de alguns dos movimentos de renovação da política, entre eles o Agora. Políticos profissionais da Rede estranham o estilo da candidata ao conduzir a pré-campanha até agora. Perguntado sobre qual seria a estratégia de Marina, um dos coordenadores da Rede respondeu ao Jornal O Globo: “se você descobrir, me conta”.
“Marina vai apostar na força pessoal, na sua posição de personalidade respeitada como defensora do meio ambiente, está jogando um tudo ou nada para atingir uma nova parcela da população, mostrando o que é”, diz o ex-senador Pedro Simon, do MDB, considerado um dos principais conselheiros de Marina.
Esse isolamento é visto quase como um sacerdócio entre os mais idealistas de sua campanha. As comparações são feitas principalmente com a campanha de 2014 quando, devido à morte de Eduardo Campos, a ex-senadora assumiu uma candidatura que, segundo seus assessores, não foi montada para ela. Herdou um marqueteiro e alianças costuradas por Campos e pelo PSB. Acabou ouvindo reclamações de que era reticente em pedir votos em palanques que não haviam sido montados por ela. Para 2018, Marina promete ser mais ativa no apoio a parceiros.
“Ela tem um partido, que ela criou, e mais a autonomia para definir a própria agenda”, admite a ex-vereadora Andrea Gouvêa Vieira, da coordenação de campanha.
Perda de apoio empresarial
Nesta situação, a equipe de Marina investe em sua imagem de alguém distante da politicagem, dos conflitos, e que se propõe a fazer um novo “pacto social” para reconstruir a política e o país após a Operação Lava-Jato. Durante a campanha, Marina planeja se comprometer a acabar com a reeleição e a usar a regra já no seu mandato. Seus colaboradores acreditam que a medida lhe daria autoridade para aprovar reformas.
Além do isolamento partidário, Marina enfrenta a perda de outros apoios importantes: não participarão desta vez seu candidato a vice em 2010, o empresário Guilherme Leal, fundador da Natura, e Neca Setúbal, acionista do Itaú, e que atuou na coordenação de seu programa de governo em 2014. Também ficará de fora o ex-deputado Alfredo Sirkis, um dos fundadores da Rede. Sirkis avalia que o recall de 20 milhões de votos das últimas eleições dará a Marina uma boa largada, mas alerta:
“Essa aura mítica da Marina faz parte da imagem da mulher honesta que nasceu no coração da floresta e chegou a senadora e duas vezes candidata a presidente. Mas a política brasileira está muito erosiva e Marina não escapou ao cansaço da população em relação aos políticos”, avalia.
Pré-candidata gosta de apelidar adversários
Além de reconhecida pela sua atuação como ambientalista e ministra do Meio Ambiente durante os dois mandatos do ex-presidente Lula na Presidência, Marina é filha de um seringueiro e chegou a trabalhar na extração do látex. Como política, não deixa a origem amazônica de lado: Marina costuma apelidar partidos e políticos com o nome de animais da Amazônia.
Ela mesma se compara a um inhambu-macucau, ave amazônica, por seu canto similar à frase “venha cá, por favor” e por ser um animal “educado, mas um pouco sem graça”, como chegou a afirmar em entrevista à rádio Jovem Pan em abril. A ministra também comparou Bolsonaro a uma hiena.
Ex-partido de Marina, o PT seria um jacu, também por causa de seu canto, que soa como “tá ruim” — a comparação, antes elogiosa ao caráter combativo do partido, agora é vista como sinal dos tempos ruins da sigla. O MDB seria o tatu-canastra: o animal é grande, chega a atingir um metro de comprimento, é forte mas, por outro lado, tem uma cabeça pequena. Na fauna de Marina, nem mesmo os jornalistas que a seguem durante suas agendas escapam da comparação aos animais. A pré-candidata costuma chamá-los de “carrapichos”.
A comparação, bondosa ou não, a depender do interlocutor, é com a planta daninha que gruda como um carrapato mas, ao contrário dele, não suga sangue.
Com informações do Jornal O Globo