Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve o cancelamento do título de 3,3 milhões de eleitores em todo o país. O contingente, que representa cerca de 2% do eleitorado nacional, gera impacto principalmente nas regiões Norte e Nordeste — onde está a maior parte dos brasileiros que não compareceram ao cartório para participar de um processo de revisão. De acordo com especialistas ouvidos pelo Correio, o maior afetado com a decisão do Supremo entre os candidatos à Presidência é Fernando Haddad, que concorre no pleito como representante do PT.
De acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no total, 4,6 milhões de eleitores não compareceram para o processo de revisão dos títulos entre 2016 e 2018 — sendo que a maioria não realizou o cadastro da biometria. No entanto, no prazo aberto para recursos, 1,3 milhão de pessoas regularizou a situação. Os que ainda estão irregulares se espalham por 1.248 municípios de 22 estados. Por 7 votos a 2, os ministros negaram a procedência de uma arguição de descumprimento de preceito fundamental apresentada pelo PSB para que o voto desses cidadãos fosse liberado. O partido pedia a suspensão das regras que impedem a participação do público citado. Segundo o TSE, 100% dos eleitores do Distrito Federal fizeram o procedimento, ou seja, ninguém na capital foi afetado pela decisão de ontem.
Em seu voto, o relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso entendeu que, apesar de a Constituição garantir o direito universal ao voto, a participação nas eleições deve ocorrer mediante regras definidas em lei. “Em Salvador, sede do TRE, foram realizados plantões no fim de semana. Não é possível afirmar que a população não estava informada ou que não houve o esforço possível para o recadastramento. O sufrágio universal é garantido pela Constituição, assim como o alistamento para votar”, afirmou Barroso. Do total de eleitores que não terão direito a voto, 53% se concentram nas regiões Norte e Nordeste. Apenas no Nordeste, são 1,5 milhão de eleitores afetados, principalmente na Bahia.
Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Dias Toffoli acompanharam o relator. Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio foram contra, e votaram pela permissão de voto. Ao divergir da maioria, o ministro Lewandowski afirmou que a quantidade é suficiente para decidir o pleito. “O TSE tem que fazer, na última hora, um esforço para esses 3,3 milhões de brasileiros que querem votar. Nas últimas eleições presidenciais, a diferença entre o que se elegeu e o que perdeu foi de 3,5 milhões de votos. Numa eleição que já vem sendo questionada por setores antidemocráticos, inclusive sob observadores internacionais da OEA, como é que vamos ficar?”, indagou.
Barroso entendeu que a decisão não prejudica o pleito, e não atinge um grupo definido de eleitores. A mesma opinião foi compartilhada pelo ministro Alexandre de Moraes. “Para que possa votar, para que possa exercer a cidadania, tem de estar devidamente alistado. Não estando alistado, porque não compareceu ao recadastramento, falta o requisito constitucional”, afirmou.
Peso eleitoral
O impedimento de ir às urnas para quem não fez a biometria é uma “decisão estapafúrdia”, na avaliação do cientista político Eurico Figueiredo, diretor do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF). “É algo que não contempla o conjunto da sociedade. Deixa de fora os mais desfavorecidos, os mais velhos e as pessoas que deixaram para fazer o recadastramento na última hora. É um casuísmo, pois não houve ampla divulgação de que era necessário fazer isso”, disse.
Para Antonio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento intersindical de Análise Parlamentar (Diap), haverá impacto na invalidação dos títulos entre os votos destinados a Fernando Haddad (PT), já que a maior parte dos eleitores com problemas está no Nordeste. “Mas não será algo tão significativo a ponto de tirá-lo do segundo turno”, explicou.
Na segunda etapa da campanha, tampouco isso terá o poder de alterar o resultado, que, na avaliação de Queiroz, é favorável a Haddad. “Um em cada três eleitores antipetistas de Bolsonaro poderá mudar de voto, caso o PT explore o fato de que não há propostas concretas para a população”, analisa. Os votos antipetistas representam cerca de 40% do apoio do capitão reformado do Exército, segundo o especialista.
Com informação do Correio Braziliense