Jovens de 20 a 29 anos estão saindo das seguradoras de saúde desde 2020, quando teve início a pandemia de covid-19. É o que revelam os dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), enviados com exclusividade ao Correio. De acordo com o órgão, mais de 12 milhões de pedidos de cancelamento de planos de saúde foram feitos somente por jovens nessa faixa etária.

Para especialistas, as gerações mais novas não enxergam o benefício de adquirir seguros.

O consultor financeiro Leonardo Borges comenta que uma das possibilidades de a nova geração não aderir aos seguros é a falta de entendimento de que se trata de uma ferramenta de investimento. “A nova geração não consegue identificar o custo-benefício, por não compreender o valor que possui esse tipo de proteção e calcula tudo somente a partir do preço. O seguro não pode ser tratado como gasto, e, sim, como investimento”, afirma.

planos de sáude
planos de sáude(foto: Editoria de Arte CB)

Desistências

Somente entre os meses de janeiro e abril de 2024 foram pedidos os cancelamentos de 540.241 planos de saúde entre jovens de 25 a 29 anos. De 2021 a 2023, os números haviam se estabilizado entre 1,64 milhão e 1,62 milhão. Já no ano da pandemia, os números ficaram um pouco abaixo, com 1.388.384 de cancelamentos.

Nos planos de saúde odontológicos, é possível perceber o aumento exponencial dos cancelamentos: em 2020 foram 1.186.610, já em 2023 o número subiu para 1.424.701, e nos primeiros 4 meses de 2024 ocorreram 472.278 pedidos.

A mesma estatística foi observada nos grupos de 20 a 24 anos, em que, desde o ano da pandemia, foram registrados mais de 5,6 milhões de cancelamentos. No entanto, o número de aderências se estabilizou a cada ano nas duas faixas etárias, com mais de 1 milhão de adesões de pessoas de 20 a 29 anos, somente em 2024. O número continua abaixo do esperado para manter os planos de saúde com segurança, segundo os especialistas.

Sustentabilidade

De acordo com o advogado administrativo Silvio Guidi a falta de interesse das gerações mais novas interfere diretamente no mercado de seguros, já que o valor pago pelos mais jovens ajuda a custear os serviços utilizados com mais frequência pelos mais idosos. “É igual à Previdência. Quem sustenta a aposentadoria e a pensão de hoje? São os jovens. É um mutualismo, o mais forte ajuda o mais fraco, mas ambos se beneficiam. Igual para o plano de saúde, mas quando a população mais nova para de contribuir, o plano começa, basicamente, a perder a fonte de receita para conseguir sustentar esse todo”.

O advogado Rodrigo Leitão esclarece que as variações de preço podem ser um dos fatores que desestimulam a adesão de seguros. “As maiores variações são os agravamentos de riscos que, ao fim, podem aumentar ou diminuir o valor do seguro a depender de sexo, local de moradia, eventos da natureza, coberturas contratadas e mesmo idade do segurado.”

Leitão salienta que, apesar do custo, o seguro-saúde é um item com o qual o jovem precisa contar, pois ele pode ser surpreendido com situações como acidentes. “A juventude precisa entender que o seguro é importante, pois a cada dia são milhares e milhares de eventos danosos (sinistros) no Brasil. Ter um seguro é perceber que se deve dar a importância necessária à vida que se possui — seja a do próprio jovem, seja a de terceiros — e pode se tornar um pesadelo caso não haja um seguro contratado.”

Um problema maior

Guidi aponta que não se trata apenas do desinteresse do jovem pelos planos de saúde. Para ele, os altos valores e falta de adesão fazem parte de um quadro maior de deficiência nas estruturas de seguros de saúde. “Se pegar um número de vidas de 2014, que são 50 milhões, e olhar para o número de vidas hoje, 51 milhões, verifica-se que o mercado está estagnado e pouco competitivo. As novas reformas para tentar melhorar o mercado são apenas um band-aid. O que precisa, no meu entender, são novos marcos legais para fazer com que retome esse crescimento, para conseguir mais 50 milhões de beneficiários em dez anos.”

Leonardo Borges contribui com a visão de que as empresas de seguros não estão dando a devida atenção aos seus beneficiários. Para eles, os seguros estão sendo usados como uma moeda de troca para o mercado. “Os seguros são muito mal administrados pelas principais instituições do país que os comercializam. São usados como moeda de troca e não avaliam a devida necessidade do cliente. Seguros, de forma geral, deveriam estar no topo dos principais produtos existentes no mercado, pois através deles podemos dirimir qualquer ponto que possa interromper o crescimento pessoal ou mesmo um projeto financeiro que esteja em andamento.”

(*)com informação do Jornal CB