A comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou, por 23 votos contra 11, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o pagamento de precatórios, permitindo descontos e reajuste pela taxa Selic. Os deputados ainda precisam votar oito destaques.
O texto aprovado é o substitutivo do relator, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) à PEC 23/21, do Poder Executivo. Além das mudanças no pagamento de precatórios, o substitutivo muda o cálculo de reajuste do teto de gastos e permite contornar a regra de ouro por meio da lei orçamentária.
O relator calcula que o novo modelo de pagamento de precatórios deve permitir uma folga de quase R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões no Orçamento do ano que vem, além de outros R$ 39 bilhões por causa de mudanças nas regras fiscais.
Dos recursos gerados pela PEC, R$ 24 bilhões devem ser usados para o reajuste de despesas da União indexadas pela inflação. Hugo Motta observou que o texto também será fundamental para garantir o pagamento do Auxílio Brasil, com a previsão de R$ 400 para atender 17 milhões de famílias no ano que vem. A proposta ainda deve garantir R$ 11 bilhões para compra de vacinas em 2022.
O pagamento de precatórios, estimado em R$ 54,7 bilhões neste ano, pode subir para R$ 89,1 bilhões no ano que vem caso a PEC não seja aprovada pelo Congresso. A proposta ainda deve ser votada em dois turnos pelo Plenário da Câmara antes de seguir para o Senado.
Direitos adquiridos
Deputados contrários à PEC afirmam que a proposta tem motivos eleitorais, além de significar um calote no pagamento de dívidas do governo, desequilibrar as contas públicas e desviar recursos que seriam destinados à educação. A oposição fez várias manobras para obstruir e adiar a votação, argumentando que o relator fez modificações no substitutivo momentos antes da reunião e no mesmo dia houve pedido de exoneração de quatro secretários do Ministério da Economia.
O relator rebateu as acusações. “Não estamos tirando direito de ninguém. Não temos o interesse de prejudicar direitos adquiridos com decisões consolidadas que o Judiciário definiu”, defendeu.
O substitutivo limita o pagamento de precatórios ao valor pago em 2016 (R$ 30,3 bilhões), reajustado pelo IPCA. A estimativa é que o teto seja de quase R$ 40 bilhões no ano que vem. Ficarão de fora deste limite o pagamento de requisições de pequeno valor para o mesmo exercício, de até R$ 600 mil, que terão prioridade no pagamento.
Os precatórios que não forem expedidos por causa do teto terão prioridade para pagamento nos anos seguintes, reajustados pela taxa Selic, acumulada mensalmente. Atualmente, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), a correção depende da natureza do precatório, podendo ser a Selic ou a inflação medida pelo IPCA mais 6% ao ano.
Para permitir o abatimento da dívida, o texto oferece aos credores a possibilidade de fechar acordo para receber o valor até o final do exercício seguinte, caso concordem com um desconto de 40%. Os valores necessários à sua quitação serão providenciados pela abertura de créditos adicionais em 2022.
A proposta do Poder Executivo estabelece ainda a possibilidade de “encontro de contas” quando se tratar de precatórios e dívida ativa. Assim, um contribuinte com direito a precatório poderá usá-lo para quitar obrigações com a União. Regra similar valerá também para estados, Distrito Federal e municípios.
Teto de gastos
O substitutivo muda o cálculo do reajuste do teto de gastos. O novo dispositivo corrige o teto pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do exercício anterior a que se refere a lei orçamentária, com base no período de janeiro a dezembro. Atualmente, é utilizado o IPCA para o período de 12 meses encerrado em junho do exercício anterior a que se refere a lei orçamentária.
Esta mudança pode aumentar o teto de gastos para 2022, já que nas projeções do mercado a inflação deste ano poder ser superior. O índice acumulado em 12 meses até junho é de 8,35%, elevando a R$ 1,610 trilhão o teto de gastos estimado no projeto de lei orçamentária do ano que vem. Já o IPCA acumulado até setembro chega a 10,25%.
O relator alegou que a revisão do teto de gastos se deveu à crise provocada pela pandemia do novo coronavírus. “Não estava escrito que teria uma pandemia e tivemos de nos adaptar a este nova realidade. Precisamos encontrar espaço fiscal para comprar vacina”, argumentou. Outro motivo é sincronizar o tempo do reajuste do teto com o de reajuste do salário mínimo, que é de janeiro a dezembro. “Não estamos furando o teto e dando cheque em branco para o governo fazer o que quer.”
Regra de ouro
O deputado Gilson Marques (Novo-SC) criticou dispositivo que permite, por meio da lei orçamentária anual, contornar a regra de ouro. Com isso, o governo poderia contrair dívidas para pagar despesas correntes, como pagamento de pessoal, juros da dívida e manutenção da máquina pública. “Isso é responsabilidade fiscal?”, questionou Marques. Ele reclamou que nenhum dispositivo da PEC diminui despesas. “Vamos contrair mais dívidas e dar calote”, lamentou.
Atualmente, para contornar a chamada “regra de ouro”, a Constituição exige a aprovação, por maioria absoluta do Congresso, de crédito adicional com finalidade específica.
Educação
A deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) afirmou que a proposta retira recursos da educação ao desvincular recursos de precatórios. “Se o governo securitizar dívida da educação, aqui está dizendo que o governo não tem obrigação de investir o recurso na educação”, comentou.
Idilvan Alencar (PDT-CE) lembrou que parte substancial dos precatórios se destina a repasses para a educação de estados e municípios referentes ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef).
“Não estamos tirando direito de professor, não estamos tirando um real da educação nem prejudicando estados e municípios”, rebateu Hugo Motta.
Municípios
O substitutivo ainda autoriza os municípios a parcelar, em 240 prestações mensais, o pagamento de contribuições previdenciárias e outros débitos com vencimento até 31 de outubro de 2021. Ato do Ministério do Trabalho e Previdência definirá os critérios para o parcelamento, oferecendo as informações sobre o montante das dívidas, formas de parcelamento, juros e encargos incidentes.
A formalização dos parcelamentos deverá ocorrer até 30 de junho de 2022 e ficará condicionada à autorização de vinculação do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) para pagamento das prestações acordadas nos termos de parcelamento.
Fonte: Agência Câmara de Notícias