Só nos últimos dois anos, a infraestrutura brasileira encolheu o equivalente a cerca de R$ 40 bilhões. Em termos comparativos, é como se o país tivesse jogado fora quatro linhas novas de metrô — como a linha lilás paulistana, ou a linha 4 amarela carioca, com custos entre R$ 8 bilhões e R$ 10 bilhões.

A perda acontece porque os investimentos feitos em 2017 e previstos para 2018 não são suficientes para compensar a depreciação da infraestrutura que já existe, demonstram cálculos da consultoria especializada Inter.B. O fenômeno deixa o Brasil atrás da maioria dos países com nível semelhante de renda, de acordo com um estudo do Banco Mundial.

Em 2017, foram aplicados em transporte, energia, telecomunicações e saneamento R$ 110,7 bilhões, ou 1,69% do Produto Interno Bruto (PIB), parcela menor do que o 1,95% de 2016. Neste ano, o investimento deve ficar em 1,7% do PIB. No período, os equipamentos de infraestrutura se desgastaram, em uma taxa estimada pela consultoria em 2,38% do PIB.

Como o desgaste está sendo maior do que reposição, melhoria e construção, as instalações no país perderam valor: eram 36,2% do PIB em 2016 e devem fechar 2018 em 35,6% do PIB. Nesse ritmo, o Brasil conseguiria prover infraestrutura básica para toda a população apenas no ano 2076, calcula a consultoria.

Para encurtar a tarefa à metade, seria preciso investir 4% do PIB por 24 anos consecutivos, afirma o economista Cláudio Frischtak, sócio-fundador da Inter.B.

“Não estamos falando de tecnologia de ponta, da fronteira da infraestrutura. Esse seria o nível necessário para, no caso do saneamento, por exemplo, universalizar o acesso a água, esgoto e tratamento de esgoto. Ainda faltaria muito para reduzir nosso desperdício, que hoje é indecente, supera 25%, para se chegar aos 6% obtidos no Japão”, diz ele.

No caso da banda larga, os cálculos levam em conta a universalização do acesso ao sistema que garante internet rápida.

“Levar banda larga a todos é extremamente importante para elevar a equidade e a eficiência, mas, para chegar a níveis de velocidade da Coreia do Sul ou da Finlândia, seria preciso investir ainda muito mais”, afirma o executivo.

A área de transportes é a que apresenta o maior déficit de investimento: o país vem colocando apenas um terço dos recursos que seriam necessário para reduzir os índices de congestionamento nas metrópoles e cidades médias – muito abaixo do necessário para oferecer transporte de massa de alta qualidade. A BR-040 entre o Rio de Janeiro e Juiz de Fora, em Minas Gerais, permite ver na prática o efeito do investimento menor do que a depreciação, exemplifica Frischtak.

Administrada pela Concer, do grupo Triunfo (com empresas envolvidas em investigações da Operação Lava Jato e em recuperação extrajudicial), a rodovia teve a manutenção comprometida e se deteriorou nos últimos dois anos. “Estamos investindo 1,7% do PIB. Países que se modernizaram estão chegando a 7% do PIB, sem contar o caso da China, que sobreinvestiu”, diz Frischtak.

Além da quantidade, há um problema sério de qualidade na forma de fazer os investimentos, que deixa o Brasil hoje com mais de 8.000 obras paradas. O Brasil investe mal, dizem tanto a consultoria Inter.B quanto o Banco Mundial, e a baixa qualidade dos projetos está na raiz do problema da infraestrutura no país.

“A alocação de capital é ruim por várias razões. A corrupção e só uma delas. Há muita incompetência no Estado brasileiro, e os ciclos políticos curtos impelem a decisões erradas”, afirma Cláudio Frischtak, da Inter.B.

“Os órgãos públicos não coletam nem processam dados obtidos pelo setor privado, nem devolvem às empresas as informações que obtêm, como ocorre no Reino Unido ou na Nova Zelândia, países considerados sofisticados em planejamento e regulação”, diz o consultor.

O Banco Mundial aponta ainda como causa para o baixo investimento brasileiro a crise fiscal por que passa o setor público. Em outros países da região, o investimento privado tem compensado o declínio do investimento público.

No Chile, o setor privado mais do que compensou a redução do investimento público, resultando em aumento do índice de investimento em infraestrutura de 3,1% do PIB nos anos 1980 para 5,2% entre 2000 e 2006.

Na Colômbia o investimento privado quintuplicou nos anos 1990. No Brasil, os investimentos privados têm crescido desde 2011, chegando a 63,3% do total em 2017, mas em níveis abaixo do necessário (1,02% do PIB), segundo Frischtak. Ele diz que não falta capital, mas a insegurança jurídica trava os investimentos privados.

“Decisões estapafúrdias do STF, até mesmo em outras áreas, aumentam a percepção do risco dos investidores em infraestrutura e, por consequência, o custo”, afirma. Outro ponto que impede que o país atinja o nível necessário de modernização é a imprevisibilidade regulatória.

“O grosso do risco brasileiro está associado ao Estado”, afirma ele. Segundo o Banco Mundial, o declínio do investimento em infraestrutura no Brasil afetou negativamente o crescimento econômico, e pode reduzi-lo ainda mais.

Desde 1980, o PIB real per capita cresceu, em média, somente 0,7%. Mesmo com a alta mais vigorosa propiciada pelo boom das commodities, a partir de 2003, o investimento em infraestrutura não se recuperou, e a lacuna resultante passou a ser vista cada vez mais como uma restrição a futuras perspectivas de crescimento.

Nos últimos dois anos, a infraestrutura no país encolheu o equivalente a cerca de R$ 40 bilhões porque o que foi investido não é suficiente para compensar a depreciação dos equipamentos já existentes.

“Não há uma estimativa exata da dimensão das necessidades de infraestrutura adicional no Brasil, mas todos os estudos existentes indicam uma lacuna considerável”, diz relatório do Banco Mundial, que sugere o nível de 4,25% do PIB até 2025 (mais da metade disso apenas para manutenção).

“Índices mais baixos de investimento em infraestrutura poderiam tornar até mesmo o crescimento histórico do PIB de 2% em algo insustentável, pois os ativos depreciam-se e a congestão do transporte aumenta.”

Se o Brasil quiser aumentar suas taxas de crescimento ou melhorar o acesso e a qualidade dos serviços de infraestrutura, serão necessários índices de investimento acima de 5% do PIB, segundo o banco.

Com informações do Jornal Folha de São Paulo