Desde que começou a cursar agronomia na Universidade Estadual de Londrina (PR), Gustavo Okano Alves Pinto, de 22 anos, queria trabalhar na área digital. No segundo ano da faculdade, um professor lhe apresentou a agronomia digital. Ela une o conhecimento da agronomia tradicional e um grande número de dados coletados no campo em tempo real, além de informações sobre o passado das lavouras. Com isso, é possível decidir o melhor momento, por exemplo, de plantar, gastando menos.
“Percebi que aquela toada da agronomia tradicional estava muito batida”, lembra Okano. De lá para cá, ele começou a procurar cursos e estágios paralelos à faculdade para se tornar um agrônomo digital. Hoje, prestes a concluir a faculdade, acredita que com essa qualificação extra poderá conseguir um emprego com salário inicial até 25% maior do que o pago a um agrônomo tradicional. “A agronomia digital é um mar de calmaria: pouca gente trabalhando e uma demanda forte por profissionais qualificados.”
O que o estudante percebeu na prática aparece nos resultados de uma radiografia do mercado de trabalho do agronegócio, feita pelo Centro de Estudos do Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Nos últimos cinco anos, o agronegócio tem absorvido cada vez menos mão de obra, sobretudo informal. Isso ocorreu por causa da incorporação de novas tecnologias no campo, mais intensivas em capital, que ampliaram a produtividade.
O resultado foi o aumento da remuneração dos trabalhadores, num ritmo mais intenso do que o da economia em geral. O campo admitiu profissionais qualificados, como Okano, e pagou mais por isso.
O estudo inédito, baseado em dados da Pnad do IBGE e coordenado pelo economista Felippe Serigatti, revela que entre 2012 e 2017 a população ocupada no agronegócio caiu 1,9% ao ano. Em 2012 eram 19,7 milhões de pessoas e, no fim do ano passado, 18 milhões.
A queda foi mais acentuada no trabalho informal (- 3,4% ao ano), mas também houve recuo nos trabalhadores formais do agronegócio (-1,4%). Na agricultura, que é um dos segmentos do agronegócio, a retração na ocupação foi bem maior: de 5% ao ano nas contratações informais e de 4,9% nas formais. “O agronegócio tem absorvido cada vez menos mão de obra informal e com menos qualificação. Isso pode parecer uma má notícia, mas não é”, afirma Serigatti.
Ele argumenta que, com o uso intensivo de tecnologia, a produtividade e a renda dos ocupados aumentou. Entre 2012 e 2017, o rendimento médio real (descontada a inflação) do trabalho no agronegócio cresceu 7%, muito acima do avanço registrado para os trabalhadores de todos os setores da economia no período, de 4,6%. Na agropecuária, o avanço acumulado em cinco anos foi de 9,2% e na agricultura, de 8,3%.
Caos
Serigatti explica que a redução de mão de obra no campo não levou ao aumento do número de desempregados. “Não compartilho dessa hipótese de que a liberação dessa mão de obra tenha levado ao caos social.” Com mais produtividade, o agronegócio, ampliou a renda nas cidades do interior e os desempregados do campo foram trabalhar no setor de serviços.
O economista faz essa afirmação com base no desempenho da economia do interior que, de acordo com o IBGE, foi melhor do que o das regiões metropolitanas. Entre 2000 e 2015, o PIB das cidades dos interior cresceu 3,7% ao ano, enquanto o das regiões metropolitanas avançou 2,5% e o do País subiu 3%.
Um estudo da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) confirma a tendência apontada pela FGV, porém com números diferentes. Renato Conchon, coordenador do Núcleo de Economia da CNA, diz que a fatia da mão de obra ocupada no agronegócio, que era de 32% em 2014, caiu para 19% em 2017. “O campo está contratando menos e pagando mais”, afirma.
A parcela de trabalhadores que recebiam até um salário, que era 33,6% dos ocupados em 2014, recuou para 29,8% em 2016. No mesmo período, a fatia dos que não tinham instrução ou até dois anos de estudo diminuiu de 34,4% para 32,3%. “O campo como mercado de trabalho para os sem qualificação está cada vez menor”, observa.
Com informações O Estado de S. Paulo