Candidato à Presidência da República pelo PSDB, Geraldo Alckmin quer criar a “Guarda Nacional como polícia militar federal apta a atuar em todo o território nacional”. Mas será que a proposta é viável?

Qual é o contexto

O policiamento preventivo e ostensivo nos estados e municípios, assim como a investigação de crimes comuns, são atribuições dos governos estaduais, de acordo com a Constituição. Cabe ao governo federal o policiamento das fronteiras brasileiras e o patrulhamento nas rodovias federais, além do combate ao tráfico internacional e interestadual de drogas e a repressão ao contrabando.

Em situações de crise ou de calamidade pública, os estados podem pedir ao presidente da República o envio da Força Nacional de Segurança Pública. Criada em 2004 pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a força foi inspirada em missões de paz das Nações Unidas. É composta por policiais militares e agentes das Forças Armadas. A força é um programa de cooperação entre os Estados, que emprestam guardas para sua formação. Atualmente, atua no Rio de Janeiro, após a intervenção na segurança do Estado, em fevereiro deste ano. Desde 2017, foi chamada também para conter rebeliões em presídios de vários estados.

Em agosto, homens da Força Nacional desembarcaram em Roraima para reforçar o policiamento na capital e a segurança em Pacaraima, na fronteira com a Venezuela. No início deste ano, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, anunciou que o presidente Michel Temer estudava a criação de uma guarda nacional. A proposta de Alckmin é semelhante à de Temer, que previa a criação de uma força militar permanente, focada no policiamento das fronteiras e no gerenciamento de crise nos estados.

Como o candidato vai cumprir a promessa

Segundo a assessoria de Alckmin, a Força Nacional seria substituída gradualmente pela Guarda Nacional. Ambas são forças policiais de caráter militar para missões em todo o país, mas a guarda teria um efetivo permanente. A guarda responderia ao Ministério da Defesa. Seriam montadas unidades para dar apoio às forças policiais dos estados em situações de crise. Cada brigada teria até 5.000 homens e seria composta por reservistas do serviço militar obrigatório que poderiam, “em caráter voluntário e mediante o recebimento de honorários”, continuar o serviço militar por mais um período.

Ainda de acordo com a assessoria do candidato, a Guarda Nacional faria a segurança em áreas rurais. Apoiaria também ações da Polícia Federal e da Receita Federal na repressão ao contrabando e ao tráfico de drogas e de armas. A primeira brigada seria instalada no Nordeste.

Para criar a Guarda Nacional, Alckmin precisaria enviar ao Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para inclui-la como um dos órgãos responsáveis pela manutenção da ordem pública do país. Questionada sobre a existência de verba para o funcionamento da guarda, a assessoria de Alckmin disse que o orçamento do Ministério da Defesa será ampliado para garantir seu funcionamento.

Nos últimos cinco anos, o orçamento do ministério aumentou, embora às vezes apenas na proporção do crescimento da economia, e não na medida desejada pelos militares, o que gerou descontentamento e críticas. O teto dos gastos públicos estabelece que o governo não pode exceder as despesas do ano anterior corrigidas pela inflação.

No caso da Força Nacional, dados do Portal da Transparência mostram que seu orçamento teve uma redução de 53% em 2018 em comparação com o ano anterior, passando de R$ 528 milhões para R$ 248 milhões.

O que pode ser feito

Os especialistas concordam que a promessa de Alckmin pode ser cumprida, mas antecipam dificuldades. A primeira, segundo o professor de direito Vidal Serrano, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, é a necessidade de mudar o texto da Constituição, e incluir as competências desta nova estrutura militar. Isso implica em alterar as atribuições das forças policiais já existentes. “Na área rural, por exemplo, a segurança compete às polícias militares. A atuação da Guarda Nacional tiraria parcela dessa atribuição da Polícia Militar.”

Desde a Assembleia Nacional Constituinte, que aprovou a Constituição em vigor, é recorrente a discussão sobre a unificação das polícias civil e militar nos estados, defendida por especialistas em segurança. Interesses corporativos das polícias, no entanto, impedem o avanço de mudanças que poderiam alterar o atual funcionamento das corporações.

Para ser aprovada, uma emenda constitucional precisa ter o apoio de 308 deputados e 49 senadores, em votação em dois turnos. A coligação de nove partidos que apoia a candidatura de Geraldo Alckmin soma, neste momento, 274 deputados federais e 36 senadores.

A segunda dificuldade, segundo o coordenador do Laboratório de Análise e Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), João Trajano, é o próprio teto dos gastos públicos, que limita por 20 anos o crescimento das despesas. Trajano afirma que seria mais viável criar um sistema de integração entre as polícias já existentes, com o compartilhamento de informações e o planejamento de operações conjuntas. “É mais efetivo, menos oneroso e mais útil do que simplesmente criar mais uma força policial”, diz o especialista.

O coordenador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (UFC), César Barreira, diz que seria mais simples investir recursos na área de investigação das polícias já existentes. A prioridade ao Nordeste, na avaliação do pesquisador, está correta. Dados do Anuário da Segurança Pública 2018 apontam que mais de 42% dos assassinatos ocorreram na região no ano passado.

Avaliação

Dá pra fazer, mas precisa mudar a Constituição.

Com informações do Portal Uol Notícias