A Justiça do Ceará aceitou denúncia e tornou réu um homem acusado de “feminicídio não íntimo”. O garçom Antonio Carlos Sousa Pereira foi denunciado pelo MPCE (Ministério Público do Ceará) por matar Bruna Gonçalves Soares, 30, na manhã do dia 26 de outubro na casa dele, no bairro Varjota, em Fortaleza. Ele será levado a júri popular.


O motivo da morte, segundo a investigação, foi o pagamento de um programa feito pela mulher no valor de R$ 50. A denúncia foi aceita pela juíza Valencia Maria Alves de Sousa, da 5ª vara do Júri de Fortaleza, no último dia 13.


A vítima estava em situação de prostituição, pois ofereceu seus serviços como profissional do sexo. Essa condição foi admitida pelo réu e atestada por outras evidências testemunhais e materiais colhidas nos autos. Nessa circunstâncias, existe uma situação objetiva de menosprezo a condição do sexo feminino. Acusado e vítima não se conheciam e não possuíam relação íntima. Portanto, trata-se de feminicídio não íntimo.


O autor da denúncia, o promotor Ythalo Loureiro, é autor de um artigo em que discute o conceito de feminicídio não íntimo, que é pouco difundido e aplicado no Brasil.


“O conceito internacional de feminicídio não se limita à esfera privada, das relações íntimas, ele também abrange violências na esfera pública, por pessoas conhecidas ou desconhecidas”, diz o texto, assinado em conjunto com o promotor Thiago Pierobom, do MPDFT (Ministério Público do Distrito Federal e Territórios).


O artigo texto cita que esse conceito leva em conta a “discriminação generalizada pela ideia estereotipada da inferioridade feminina.” “A construção do conceito de feminicídio não íntimo funciona como a amplificação do conceito padrão”, relata.


Nesses termos, o feminicídio não íntimo é a expressão do preconceito institucionalizado e intersubjetivo de discriminação em razão do sexo feminino. O feminicídio não íntimo é uma singularidade inquietante. No plano macro, o feminicídio é estrutural, pois a violência de gênero possui fontes históricas e se reproduz invisivelmente nas diversas instituições do tecido social, alimentada pelas representações sociais machistas. No plano micro das relações intersubjetivas, o feminicídio não íntimo se manifesta nas múltiplas expressões de discriminação de sexo, de orientação sexual e de identidade de gênero.


Para eles, é provável que inúmeros casos de feminicídio não íntimo estejam sendo “invisibilizados” pelo poder público.” “É necessário elevar a qualificação dos profissionais da segurança pública e justiça para um melhor reconhecimento destes casos de feminicídio não íntimo, dando a necessária visibilidade quanto às razões de gênero subjacentes às mortes de mulheres”, finalizam.


Segundo a investigação, Antonio conheceu a vítima através de um site chamado “Acompanhantes de Luxo”. Ele marcou um encontro em sua casa, e a mulher teria cobrado R$ 50, com a promessa que ele seria pago mediante transferência PIX. Depois de concluído o serviço, Antonio disse que não tinha o valor acertado e resolveu ir até o mercadinho próximo de sua casa para pedir esse dinheiro emprestado, mas que foi negado pelo proprietário do estabelecimento.


Em seguida, Antonio voltou para casa e informou à vítima que não tinha o dinheiro. Bruna insistiu para receber o valor do pagamento, o que gerou uma fúria do acusado.


“Em resposta, o acusado simplesmente foi até a cozinha, pegou uma faca de cortar carne, retornando ao quarto, surpreendeu a vítima com um feroz ataque, enquanto ela ainda estava entre a cama e uma parede, assim, dificultando a defesa da vítima.”


Bruna foi morta com golpes de faca na boca, orelhas, nuca, pescoço, seio e ombro direito. O caso passou a fazer parte do programa “Tempo de Justiça”, que reúne órgãos para dar celeridade na análise e busca que crimes sejam julgados em até dois anos após o ato, especialmente os feminicídios.