A indefinição sob a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixa as eleições deste ano, tanto no âmbito federal quanto estadual, como uma incógnita. Líder nas intenções de voto, Lula é peça chave de uma quebra-cabeça arquitetado pelo PT em diversos estados brasileiros.
A indecisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o pedido de habeas corpus preventivo apresentado pela defesa do ex-presidente foi um dos responsáveis por aumentar ainda mais as incertezas, já que a possível saída da cena política por parte de Lula atrasa as negociações de seu partido em alianças regionais.
Para não perder o bonde das tratativas políticas dos palanques estaduais, o PT adotou a estratégia de empurrar com a barriga as conversas, e evita selar compromissos até o último minuto. As convenções partidárias que anunciarão as chapas em todos os estados ocorrerão entre 20 de julho e 5 de agosto. O PT deve esticar a corda das negociações em torno de acordos estaduais até junho.
“As alianças estão sendo postergadas por conta da incerteza com relação à prisão de Lula. Todos fazem o seguinte cálculo: vale a pena estar aliado ao PT sem ter Lula no meu palanque?”, pontua um petista.
O Nordeste é a região mais dependente da presença ou não de Lula. Na região, o nome do petista é uma marca muito mais forte do que a de seu partido. Se na corrida pelo Palácio do Planalto, Lula chega a 37% das intenções de voto (segundo o último Datafolha), quando o recorte é o Nordeste, a popularidade do petista salta para 60%. O PT aposta suas principais fichas em seis candidaturas próprias ao governo, sendo quatro à reeleição (Minas Gerais, Bahia, Piauí e Ceará) e outras duas (Acre e Rio Grande do Norte) nas quais os competidores petistas correm na frente de seus rivais. Além dessas, o partido fala em lançar nomes em pelo menos outros cinco estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Pará, Rio Grande do Sul e Pernambuco.
Embora a Lei da Ficha Limpa impeça a presença do nome de Lula na urna eletrônica em outubro, a estratégia do PT é tentar manter o seu nome como candidato à Presidência até que ele seja declarado inelegível. O registro de sua candidatura deve ser feito no último dia do prazo: 15 de agosto. Com isso, os petistas esperam manter vivo o potencial eleitoral Lula. O sonho de consumo da legenda é que o ex-presidente esteja livre durante a campanha para poder participar dos diversos palanques e gravar vídeos para correligionários e aliados.
Enquanto a Justiça não toma uma decisão em relação à prisão ou não de Lula, a indefinição complica o cenário em vários estados. Um dos mais confusos é o do Ceará. Lá, o governador Camilo Santana (PT) deverá disputar a reeleição em coligação com PDT do presidenciável Ciro Gomes e com o MDB do presidente Michel Temer. A chapa deverá ter como candidatos ao Senado o ex-governador Cid Gomes, irmão de Ciro, pelo PDT, e o atual presidente do Senado, Eunício Oliveira, pelo MDB.
Eunício Oliveira, que busca a reeleição, já declarou publicamente o voto em Lula e adotou um bordão que tem sido usado a quem o procura cobrando explicações sobre o apoio a Lula: “Meu compromisso é com Lula, não com o PT”. Aqui está uma bagunça: o governador quer ter o apoio de Lula na campanha, mas vai ter que se equilibrar entre o MDB, a quem ele chama de golpista, mas depende por causa das verbas federais, e a família Gomes. Com isso, aglutina forças antagônicas no mesmo palanque, diz um deputado de oposição ao PT que preferiu não se expor.
Em Alagoas, terra de Renan Calheiros, a aliança do PT com o MDB, que possibilitou a primeira eleição de Renan Filho como governador, deve ser reeditada. Renan também declarou voto em Lula, e subiu no palanque do petista no ano passado, quando ele chegou com sua caravana em Alagoas. “Renan acredita que o Lula vai dar voto a ele. Em Alagoas, enquanto Temer tem uma rejeição muito grande, o Lula tem mais de 50% das intenções de voto”, diz um rival de Renan.
Mas como no Ceará de Eunício, o pacto do MDB com o PT em Alagoas só vale se Lula puder fazer campanha. Caso o partido tenha que substituir Lula por outro quadro – cenário mais provável – Renan deverá ter um plano B.
“Renan incorporou a agenda de Lula em suas falas e tem combatido a plataforma de Temer, como a reforma trabalhista e a previdenciária. Mas com o Lula fora de cena, dificilmente terá o mesmo ânimo”, diz outro adversário dos Calheiros.
Pernambuco, estado natal de Lula, apresenta a situação mais aflitiva para o PT e seus aliados nas eleições do dia 7 de outubro. No estado, o governador, Paulo Câmara, do PSB, clama pelo apoio de Lula em sua campanha pela reeleição. Afilhado político de Eduardo Campos, candidato à Presidência pelo PSB que morreu em acidente aéreo em 2014, Câmara conta com Lula para percorrer o Estado e tornar sua reeleição mais provável. Mas nem Lula, diante da possibilidade de uma prisão iminente, nem o PT garantem o apoio ao governador. Ao mesmo tempo, o ex-presidente alimenta as pretensões de Marília Arraes, do PT, neta de Miguel Arraes, de concorrer ao governo estadual. A indefinição do palanque nas eleições majoritárias – e da presença de Lula –afeta as demais candidaturas em série. O senador Humberto Costa (PT-PE) só considera viável uma tentativa de reeleição para o Senado se seu palanque tiver Lula e Câmara.
Em Minas, Piauí e Acre, menos “luladependência”
Em estados nos quais o PT está no governo, há maior facilidade para costurar as alianças, e a “luladependência” é menor. Em Minas Gerais, por exemplo, as negociações estão bastante avançadas para que o governador Fernando Pimentel tenha o apoio do MDB, PR, PCdoB, PV e PRB. A chapa reproduziria a base de apoio ao governador petista na Assembleia Legislativa.
“Em Minas, a situação do Lula solto ou preso não é tão preponderante para definir os nossos acordos. Acreditamos, porém, que, em qualquer situação, ele será um ator importante da eleição”, disse um aliado do governador.
No Piauí, o panorama é parecido. O governador Wellington Dias já dá como certos os acordos com MDB, PDT, PR, PSD e PP. O PTB também está no radar dos petistas, mas pode lançar um nome.
No Acre, onde o PT está no poder há 19 anos, tendo os irmãos Jorge Viana (senador) e Tião Viana (governador) como lideranças, o PT precisa igualmente menos de Lula. Uma ampla aliança do PT com PDT, PSB, PV, PSL e PSH dão sustentação ao atual governo e deve se manter na próxima campanha, mas a chapa para o governo estadual e para o Senado deverá ser puro sangue, com petistas concorrendo para todos os postos. “Estamos num projeto de governo há quase 20 anos. Temos menos dependência da figura do Lula”, diz o deputado César Messias (PSB-AC).
Na Bahia, a situação também já está mais definida. PSD, PSB, PP, PR e Podemos já são dados como certos na chapa do governador petista Rui Costa, que disputará a reeleição.
Com informações do Jornal O Globo