O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu nesta terça-feira (29) criar uma comissão especial para debater o projeto de lei que pode anistiar as penas dos condenados pelos atos de vandalismo em Brasília, em 8 de janeiro de 2023. Na prática, a decisão devolve à estaca zero a tramitação do texto, que estava na pauta de votações da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desta terça. O projeto não será mais analisado pela CCJ – nem agora, nem depois. Se fosse aprovado pela CCJ, o texto iria direto para o plenário da Câmara, onde caberia ao próprio Arthur Lira a decisão de colocar o projeto em votação.
Ao criar a comissão especial, Lira cria uma tramitação mais longa para a matéria: os partidos terão que indicar membros, a comissão terá que ser instalada, eleger presidente e relator, criar cronograma de debates e, só então, votar. A CCJ é comandada pela deputada Caroline de Toni (PL-SC), aliada do ex-presidente Jair Bolsonaro e defensora do projeto. A parlamentar chegou a colocar o texto em votação, mas aliados de Lula pediram mais prazo e adiaram a análise.
O texto é considerado inconstitucional por juristas e, mesmo se aprovado na Câmara, tem ainda que passar pelo Senado e pela sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Se entrar em vigor, pode também ser alvo de questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF).
O ataque às sedes dos 3 Poderes e à democracia foi sem precedentes na história do Brasil. Os vândalos quebraram vidraças, móveis, obras de arte e objetos históricos, invadiram gabinetes de autoridades, rasgaram documentos e roubaram armas. O projeto perdoa as condenações dos participantes dos atentados. O texto atinge todas as medidas de restrição de direitos: prisão, uso de tornozeleira eletrônica e restrições de comunicação, por exemplo.
Segundo o texto, ficam perdoados todos os que participaram de “manifestações” com motivação política e eleitoral, ou as apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas, entre 8 de janeiro de 2023 e o dia de entrada em vigor da lei. A proposta permite que o perdão se estenda a eventos anteriores ou subsequentes, desde que haja relação com os atos de 8 de janeiro. O texto, no entanto, não alcança os crimes de tortura, tráfico de drogas, terrorismo, os crimes hediondos e crimes contra a vida.
Além disso, o projeto:
- altera a redação dos crimes de Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito e Golpe de Estado, exigindo que haja necessidade de violência contra a pessoa para enquadramento nos delitos;
- anula as multas aplicadas pela Justiça Eleitoral a pessoas e empresas que tenham de alguma forma participado dos atos;
- estabelece que condenações por crimes contra o Estado Democrático de Direito não poderão ser baseadas nos chamados crimes multitudinários — aqueles cometidos em grupo, quando todos contribuem para o resultado a partir de uma ação conjunta;
- devolve direitos políticos e termina com outras implicações cíveis ou penais para todos os beneficiados pela anistia.
O relator também propôs que pessoas físicas e jurídicas não poderão ser diretamente punidas por financiar movimentos e manifestações em que integrantes agirem contra a lei. A responsabilização penal, segundo o parecer, somente poderá ocorrer se houver comprovação de dolo direto (intenção) e nexo causal entre o auxílio prestado, as condutas antijurídicas praticadas e o resultado produzido.