A empresária Mônica Moura, mulher do marqueteiro João Santana, relatou em delação premiada detalhes da entrega de caixa 2, em 2012, da campanha eleitoral do então presidente venezuelano Hugo Chávez (morto em 2013). O responsável por pagar ‘malas de dinheiro’, segundo a delatora, era o então chanceler do país vizinho, Nicolás Maduro, sucessor de Chávez.

Mônica disse que cobrou US$ 35 milhões pela campanha.

“Nunca recebemos tudo, mas foi cobrado US$ 35 milhões”, relatou. “O Maduro me pagou quase semanalmente dinheiro, ele me entregava dinheiro na própria chancelaria, lá no prédio da chancelaria, às vezes no Palácio de Miraflores. Às vezes ele me chamava na chancelaria, eu ficava lá horas esperando. O próprio Maduro, entregues da mão dele, malas de dinheiro, várias.”

O Ministério Público Federal questionou Mônica Moura se ela não tinha receio.

“Tinha muito. Sabe o que ele fazia? Ele mandava me buscar com o carro dele, carro blindado, carro preto daquelas caminhonetes de roqueiro americano, de funkeiro americano, sei lá, rapper americano, com mais dois carros, um na frente outro atrás, me levava para a chancelaria, entrava pela garagem”, afirmou.

Mônica narrou o passo a passo. “Os seguranças subiam comigo para a sala dele, eu ficava lá esperando, tomando muito chá de cadeira do Maduro. Eles não têm o menor compromisso com horário. Depois, ele me chamava na sala dele, conversava um pouquinho conversa fiada de política e depois me entregava o dinheiro. Ele próprio, não mandava ninguém me entregar. Ele entregava. Depois eu descia com o segurança dele, os seguranças, para a mesma garagem. O carro estava me esperando, ele levava até o hotel de volta.”

Mônica disse que no local distribuía os valores. “Era muito dinheiro”, relatou. “As entregas variavam entre US$ 500 mil de cada vez, às vezes 300. Cheguei a receber US$ 800 mil de uma vez só.”

A delatora relatou que cobrou US$ 35 milhões pela campanha de Chávez, mas não recebeu o montante total. Segundo ela, a Odebrecht arcou com cerca de U$$ 7 milhões, a Andrade Gutierrez pagou U$$ 2 milhões, por meio de depósito na Suíça, na conta da Shellbill. Restou uma dívida de U$$ 15 milhões ‘nunca saldada’.

“A gente tomou um cano histórico”, declarou. “Eu recebi mais de US$ 10 milhões em dinheiro durante 8 meses de trabalho, quase nove meses de trabalho.”

Corrida. A campanha de Chávez, afirmou Mônica Moura, foi um pedido de Lula. Ela revelou que na época, o petista, já fora da Presidência, chamou o publicitário João Santana, seu marido.

“Em 2011, um ano antes da campanha de reeleição do presidente Chávez, o presidente Lula mandou chamar o João e disse pro João que o presidente Chávez tinha pedido uma intermediação para o João fazer a campanha dele de reeleição na Venezuela”, declarou. “Eles (Lula e Chávez) eram muito amigos.”

Segundo a delatora, a campanha foi ‘dificílima’.

“Primeiro, a situação na Venezuela na época já era bastante caótica, já tinha gente da oposição que eles prendiam a torto e a direito. Eles, que eu digo, é o governo Chávez, né? Já tinha uma situação bem confusa politicamente na Venezuela. Todo mundo apostava que Hugo Chávez não conseguia se reeleger. Essa já era, acho, que a terceira reeleição do Chávez”, afirmou. Chávez governou a Venezuela por 14 anos, de 1999 a 2013, até sua morte.

Mônica disse que a campanha de Chávez foi ‘bem cara’. “Tinha que levar gente, lá na Venezuela a mão de obra de lá é muito ruim. Como o governo abarca tudo, eles empregam todo mundo, então, todo mundo é muito encostado, não tem uma mão de obra especializada em cinema, em televisão”, relatou.

A campanha foi feita sem contrato, de acordo com a empresária. Mônica Moura afirmou que passou ‘6, 8 meses’ atrás do acordo.

“Eles escapavam pela tangente, nunca foi feito. Foi todo pago em caixa 2”, afirmou.

A empresária afirmou que Maduro informou a ela que a Odebrecht pagaria uma parte da campanha e que a Andrade Gutierrez também iria ‘colaborar’.

O ex-ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social do governo Lula, Franklin Martins, segundo a delatora, cobrou ‘cerca de 8 ou 10 milhões de dólares’.

“Quando a gente foi acertar de receber dinheiro, o Maduro falou para mim o seguinte: ‘Olha, você receber dinheiro diretamente comigo e eu não quero ficar pagando todo mundo assim, muita gente, eu não quero esse contato com muita gente. Então é o seguinte: eu pago pra você a sua parte e eu pago a parte do Franklin Martins”, narrou.

COM A PALAVRA, FRANKLIN MARTINS

A reportagem tentou contato com o celular do ex-ministro Franklin Martins. O espaço está aberto para sua manifestação.

COM A PALAVRA, A DEFESA DE LULA

Em nota, os advogados Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins esclareceram.

“O ex-presidente Lula nunca tratou direta ou indiretamente do financiamento das campanhas eleitorais em que foi candidato ou apoiador.

Lula sempre considerou este assunto de competência dos tesoureiros do partido e das campanhas, que prestam contas à Justiça Eleitoral.

São mentirosas, portanto, as afirmações atribuídas ao Sr. João Santana e à Sra. Monica Moura, claramente vinculadas à negociação de benefícios penais na Operação Lava Jato.

Hoje está muito claro que citar o nome de Lula tornou-se condição obrigatória para que réus e até condenados obtenham os favores na promotoria no âmbito da Operação Lava Jato. Há pedido formal de investigação protocolado na Procuradoria Geral da República com base em denúncia veiculada por órgãos de imprensa.

Nenhum dos delatores, no entanto, apresentou qualquer prova das menções feitas a Lula. Todas as menções se referem a supostas conversas com terceiras pessoas, ao ouvir dizer ou a conclusões subjetivas.

Uma ação penal se decide na base de provas. E provas contra Lula não há, porque ele sempre atuou dentro da lei.”

Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins

COM A PALAVRA, A ANDRADE GUTIERREZ

A Andrade Gutierrez informa que segue colaborando com as investigações em curso dentro do acordo de leniência firmado pela empresa com o Ministério Público Federal e reforça seu compromisso público de esclarecer e corrigir todos os fatos irregulares ocorridos no passado.

Com informações O Estado de São Paulo