A falta de segurança no País custa, tanto ao governo quanto aos brasileiros, mais de R$ 365 bilhões por ano, número equivalente a 5,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Aumento no frete, produtos mais caros, impacto nas exportações, seguros exorbitantes, evasão de investimentos, produtividade comprometida e funcionários traumatizados são algumas das consequências do aumento da violência no País, segundo aponta um levantamento inédito feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), ao qual o Jornal O Globo teve acesso.
Calculado com base em dados oficiais publicados entre 2012 e 2016 e compilados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o passivo bilionário, se dividido por cada brasileiro, resultaria em uma conta anual de R$ 1,8 mil.
O número parece grande. É maior. Segundo especialistas, a estimativa é conservadora. “Todas essas perdas são muito difíceis de mensurar. Estimamos esses R$ 365 bilhões, mas o prejuízo tem potencial de ser bastante maior”, sustenta Maria Carolina Marques, especialista em políticas em indústria da CNI.
Para se ter uma ideia, a cifra total equipara-se aos setores da construção (5,2%), da agropecuária (5,3%) e é superior à indústria extrativa-mineral (petróleo e minério de ferro) e de utilidade pública (água, esgoto e energia elétrica), que, somadas, representam 4,5% do PIB brasileiro.
Os dados mostram que as despesas públicas com segurança e sistema prisional anuais somaram R$ 101 bilhões, enquanto os custos privados se igualam a R$ 264 bilhões. Em 2016, por exemplo, os gastos com segurança pública apenas das secretarias estaduais somaram R$ 86 bilhões. E em 2015, segundo o estudo, a indústria gastou R$ 112 bilhões com segurança privada e seguros.
Os custos sobre a saúde pública, educação e turismo, embora “intangíveis”, merecem atenção, segundo a pesquisadora da CNI. No caso do Rio Janeiro, por exemplo, a falta de segurança reflete também na capacidade de aprendizado dos alunos de escolas em comunidades conflagradas pelo tráfico e por milícias. Segundo Carolina, isso traz consequências de longo prazo sobre a produtividade desses alunos no mercado de trabalho.
Mais gastos, menos resultados
O estudo foi entregue pela CNI a seis pré-candidatos à Presidência da República: Marina Silva (Rede), Jair Bolsonaro (PSL), Geraldo Alckmin (PSDB), Henrique Meirelles (MDB), Ciro Gomes (PDT) e Alvaro Dias (Podemos).
Embora os gastos com segurança tenham sido incrementados pela União, por estados e municípios, a violência continuou a subir no decorrer dos últimos dez anos, conforme o levantamento. Entre 2007 e 2016, a administração pública das três esferas de governo aumentaram em 27,5% os gastos com segurança, descontada a inflação.
Na esteira desse aumento, cresceu também a repressão à criminalidade, o que produziu um número maior de criminosos presos. O levantamento mostra que o total de encarcerados cresceu 144% em 12 anos. Em 2005, havia no Brasil 297 mil presidiários. Em 2016, esse número se aproximou dos 700 mil — novos dados ainda estão sendo consolidados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A repressão, no entanto, não conseguiu estancar a violência. Os roubos de carga no Brasil, por exemplo, aumentaram 31% em dez anos, de 2007 a 2016 — passando de 10,1 para 13,2 por 100 mil habitantes. No mesmo período, os assaltos a instituições financeiras saltaram de 1,5 para 2,2 a cada 100 instituições — alta de 47%.
“Há um aumento de prisioneiros bastante significativo, o que acarreta aumento nos gastos, mas continua havendo aumento de homicídios e roubos de carga. A questão não é só gastar mais, você precisa gastar bem”, diz Renato da Fonseca, economista da CNI que coordenou o estudo.
Soluções possíveis
Entre 2011 e 2016, a expansão do número de casos de roubo de cargas foi ainda maior, atingindo 86%. Só os estados de São Paulo e Rio de Janeiro responderam, juntos, por 89% das 22.547 cargas roubadas em 2016. O custo desse tipo de crime é embutido no preço das mercadorias e faz o país menos competitivo no mercado internacional.
Em 2015, os gastos de empresas com seguros para veículos, cargas e patrimoniais somaram R$ 50 bilhões. O preço do frete também subiu, engrossado pela cobrança de uma alíquota referente aos custos com gerenciamento de riscos, que pode chegar a 1% sobre o valor da carga.
Para além do impacto direto nas despesas, as empresas ainda têm de arcar com problemas de produtividade gerados pela falta de segurança. Segundo aponta o levantamento, em 2015, houve 56 mil internações hospitalares de vítimas da violência, o que representou um custo de R$ 85 milhões para o sistema público de saúde.
Apresentado pelo governo federal como parte da solução para o problema da segurança no país, o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), aprovado em maio pelo Senado, é considerado tímido por especialistas.
“O Susp avança, mas não é uma legislação que vai resolver o problema. Embora toque no ponto certo, ainda é tímida porque não cria condições para coordenação efetiva e integração. Vai depender de quem for eleito, tanto no âmbito estadual quanto federal, colocar essa lei em prática”, avalia diz Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Segundo o estudo, parte da solução para a segurança é corrigir a formação de policiais e criar um banco de dados judiciais integrado entre poderes. “A formação e o treinamento de investigadores no Brasil é muito deficiente. Não são treinados com técnicas de investigação e interrogatório, por exemplo. Eles aprendem mais com os mais antigos sem método. Um foco melhor em perícia e formação traria melhores resultados”, afirma Maria Carolina Marques, da CNI.
Com informações do Jornal O Globo