Após protestos nas redes sociais e críticas de especialistas, o deputado federal Eduardo Bismark (PDT/CE) decidiu rever uma proposta incluída no projeto de lei (PL 2.999/2019), do qual é relator, que extinguia a perícia médica independente para contribuintes do INSS que tiveram benefícios negados ou cancelados pelo órgão.
A consequência do artigo inserido no texto seria deixar o cidadão que eventualmente se sentiu lesado com a avaliação dos peritos federais — os mesmos, de acordo com os críticos, responsáveis pela retirada dos benefícios.
Eduardo Bismark prometeu que, nesta segunda-feira, vai protocolar um novo relatório com a mudança do item.
“O objetivo da medida foi reduzir custos, e ela teve apoio do Ministério da Economia, dos peritos e do Judiciário. Tenho conversado muito com todas as partes. Entretanto, por causa da polêmica, vou incluir um parágrafo explicando que a convocação da perícia independente é da deliberação do juiz (conforme é hoje). Se ele questionar qualquer resultado, pode vetar ou convocar outro especialista. Aí, acho que atendemos a todos: médicos, Justiça e equipe econômica”, diz o deputado.
O PL 2.999/2019 trata da remuneração dos peritos do INSS e está na pauta da CCJ para votação na terça-feira.
Atualmente, quando o segurado da Previdência Social tem algum problema que o deixa permanente ou temporariamente incapacitado, a primeira perícia é feita por peritos médicos federais. Quando o laudo não está de acordo com o que o doente ou o incapaz pensa ou sente, ele busca o Judiciário. Durante o processo, o magistrado convoca outro especialista na mesma área, de fora do serviço público, para ter uma segunda opinião. É justamente essa segunda opinião que será prejudicada se a proposta de Birmark permanecer no projeto de lei.
O relator alegou ter proposto a eliminação da perícia independente por motivo de economia. No relatório apresentado à CCJ em 26 de junho, ele explica que uma única perícia judicial pode chegar, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), a R$ 1.850.
“Estima-se que em 2019 o montante necessário ao custeio das perícias judiciais alcance o valor de R$ 316 milhões e, em 2020, se nenhuma providência for adotada, ultrapasse R$ 328 milhões”, afirma. Dessa forma, seria mais racional aproveitar melhor do corpo de peritos médicos federais, “com o objetivo de realização da perícia também na esfera judicial”.
De acordo com a advogada Viviane Moura de Sousa, presidente da Comissão de Direito Previdenciário da seção do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF), a proposta “é, no mínimo, imoral”.
“Entendemos que, se o INSS já negou a perícia, a parte lesada, que é o pobre, vai ficar mais lesada ainda. Além disso, o isolamento da carreira dos peritos federais também já foi criticado pelo Conselho Federal Nacional”, destaca Viviane.
O juiz Guilherme Feliciano, do Departamento de Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (USP) e ex-presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), destaca que, “de fato, há uma incoerência quando o perito que realiza a prova judicial pertence ao mesmo corpo que originalmente recusou àquele cidadão o seu direito”. Não é adequado, afirmou, aproveitar os peritos federais, quando a própria União é a ré.
Especialista defende servidor
O especialista em direito previdenciário Washington Barbosa, diretor acadêmico do Instituto Duc In Altum, não vê problema no fato de o perito federal eventualmente fiscalizar o trabalho de um colega.
“O especialista tem responsabilidade profissional e, em caso de fraude, responde a processo ético, civil e penal. Nenhum laudo é irrefutável e todos merecem contraditório. Acho que dá mais segurança que o processo, no todo, seja tratado por um concursado do que por uma perícia privada”, argumenta.
Na análise do advogado Diego Cherulli, porém, a ideia por trás do PL 2.999 é extinguir a perícia independente, apesar do prejuízo para o cidadão.
“É importante destacar que a maioria das perícias que passaram pelo pente-fino do INSS estão judicializadas. Isso causa ainda mais prejuízo para os cofres públicos porque, lá na frente, além da indenização, a União vai ter que bancar aquele direito com juros e correção monetária. É nisso que o governo tem que pensar. Não é adequado que um grupo que nega seja o mesmo que vá avaliar a contestação do que foi negado”, ressalta.
Francisco Cardoso, presidente da Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social (ANMP), critica as declarações da representante da OAB/DF e do advogado Diego Cherulli.
“Nós temos fé pública. Somos isentos e não dependentes de gestor ou de governo. Podemos, sim, emitir laudo mesmo quando a União é parte do processo. Trabalhamos para o Estado e não precisamos da amizade de juízes”, afirmou. Ele disse ainda que, “se a OAB fosse coerente, deveria sair do processo (acompanhamento do PL 2.999)”.
Por meio de nota, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) lembrou que dados do TCU demonstram que os custos médios periciais na Justiça Estadual chegam a ser 50% maiores do que na Justiça Federal. No Tribunal do Mato Grosso do Sul, em que a perícia judicial é mais cara, o custo médio chegou, em 2016, próximo ao máximo estipulado pelo Conselho de Justiça Federal (R$ 720).
“Os dados ainda apontam que, embora a Justiça Federal possua 85% dos processos previdenciários (acidentários ou não), ela é responsável por apenas 17% do total gasto com perícias, enquanto a Justiça Estadual (apenas nas ações acidentárias e delegadas) é de 27%”, destaca a Ajufe.
(*)com informação do Correio Braziliense