Convicto de que o presidente Michel Temer foi vítima de uma conspiração para ser derrubado, o deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), indicado para relatar a segunda denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), é professor de Direito Constitucional e descendente direto de um dos mais tradicionais clãs da política brasileira, o de José Bonifácio.
Mas, por ter votado pela derrubada da primeira denúncia e ser do grupo do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG), tem contra si a desconfiança da ala não governista de que vai apresentar um parecer recomendando que a Câmara rejeite, mais uma vez, autorização para que o Supremo Tribunal Federal analise se aceita a denúncia contra o presidente.
Há dois meses, ao proclamar seu voto contra o prosseguimento da primeira denúncia, o novo relator justificou o apoio ao parecer vencedor de Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), que indicava a rejeição: “Sim! A favor das instituições e do progresso do Brasil”. Hoje, continua acreditando na inocência de Temer e sugere que ele processe o empresário Joesley Batista, que grampeou o presidente em um encontro noturno no Jaburu.
— O presidente Temer foi vítima desse homem da JBS. Esse Joesley conseguiu, através de meios não muito sérios, entrar no palácio. Vai conversar com o presidente e leva um gravador escondido? Isso é um fato da maior gravidade, e ele deve ser processado — disse Bonifácio ao GLOBO.
Aos 87 anos, e no oitavo mandato de deputado federal, não tem só o nome do patriarca da independência José Bonifácio de Andrada. É descendente do tutor do imperador Dom Pedro II e integra a quinta geração da família. Segundo levantamento do Congresso em Foco, nos últimos 190 anos, o clã dos Andrada produziu 15 deputados e senadores, quatro presidentes da Câmara, oito ministros de Estado e dois ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), além de governadores, prefeitos e vereadores. Ao todo, rendeu mais de 20 políticos e ocupantes de altos cargos públicos.
O primeiro mandato de Bonifácio, filho do diplomata José Bonifácio de Andrada e Silva, foi o de vereador em Barbacena (MG), em 1954 — ano em que o então presidente Getúlio Vargas se matou. Além da sucessiva presença na Câmara dos Deputados, disputou a vice-presidência da República numa chapa encabeçada por Paulo Maluf, em 1989, correligionário nos extintos Arena e PDS.
O filho do deputado, que foi subprocurador-geral da República na gestão de Rodrigo Janot, José Bonifácio Borges de Andrada, chegou a ser cotado para o cargo de procurador-geral pelo presidente Temer.
O deputado garante que seu voto será técnico, depois de analisar a denúncia da PGR. Na primeira, o voto sim, explicou, foi fruto da fragilidade da delação de Joesley e da falta de provas que ligassem Temer à mala de dinheiro entregue a seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures.
— Sou professor de Direito Constitucional e votei, na primeira denúncia, levando em conta o aspecto técnico. O que dizia Joesley na delação e a entrega da mala para o assessor não serviam de base para vincular o presidente Temer. Sou tradicional e, no caso de dúvida, você tem que decidir pró-réu. Agora vou ver o que tem no processo — diz.
Apesar da desconfiança da oposição sobre seu possível parecer pró-Temer, Bonifácio é elogiado tanto entre aliados como entre adversários por seu preparo jurídico. Decano da Câmara, Miro Teixeira (Rede-RJ) ressalta a gravidade da segunda denúncia contra Temer, mas diz ser injustiça que o deputado seja prejulgado.
— Ele tem base jurídica para fazer um parecer absolutamente justo. E para ser um parecer absolutamente justo, tem que autorizar o STF a proceder a investigação contra Temer. A denúncia é muito contundente. Eu imagino que poderemos divergir em relação ao parecer. Mas, desconfiar previamente, como se ele fosse se vender, é injusto — defende Miro.
— O deputado Bonifácio é um nome muito respeitado em Minas Gerais, membro de uma das mais tradicionais famílias da política brasileira, que une à sua experiência parlamentar um conhecimento técnico profundo. Reconhecido professor de Direito, é pessoa muito afável, respeitado por todos e que orgulha muito nosso partido por sua atuação e capacidade — concorda o senador Antônio Anastasia (PSDB-MG).
Apoiador do regime militar
Apoiador confesso do regime militar — Bonifácio integrava a Arena, partido de sustentação á ditadura —, ele explica por que se ausentou da votação da emenda que instituiria eleições diretas no país em 1984. No colégio eleitoral, votou a favor da candidatura derrotada de Paulo Maluf.
— Era outro momento histórico. Eleições diretas, naquele momento, tinham outro sentido, era uma fase transitória com muitos conflitos políticos. Eu era da Arena, que apoiava os presidentes militares dentro da Constituição e sofri muito a oposição do que era o início do PT naquele momento. Era uma fase dominada por questões internacionais, da Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética. A esquerda brasileira se uniu aos soviéticos, e por pouco não teve uma guerra atômica — justificou Bonifácio.
Com informações O Globo