O senador José Serra alegou um único pretexto, mas na verdade pesaram três motivos para pedir demissão de um dos cargos mais importantes da República, o Ministério de Relações Exteriores. Além das dores na coluna, que ele não conseguiu superar após a cirurgia de dezembro, e da depressão, que vem aumentando, Serra não estava feliz no cargo, que é muito distante da Fazenda com que sonhou, e temia entrar num bolo comum dos ministros e parlamentares da base aliada citados na Lava Jato.
Pelo menos desde o final do ano passado, amigos e correligionários do ministro vinham demonstrando preocupação com o desânimo dele no cargo. Considerado muito atuante no Ministério do Planejamento e brilhante no Ministério da Saúde, ambos no governo do amigo Fernando Henrique, Serra dava sinais desconforto no Itamaraty. Sua agenda era vazia, vários dias seguidos resumida a despachos com o secretário geral, embaixador Marcos Galvão.
Mesmo na viagem do presidente Maurício Macris, um importante ponto para a aproximação dos dois governos, do Brasil e da Argentina, o chanceler brasileiro parecia distante, distraído. Entre os diplomatas, havia constrangimento. No Planalto, preocupação. Na bancada do PSDB na Câmara e no Senado, expectativa. Antes de assumir o Itamaraty, ele foi o senador a aprovar o maior número e os mais importantes projetos no Congresso. Um exemplo foi a flexibilização das regras de exploração do Pré-Sal.
Serra – que foi o primeiro grão tucano a aderir à tese do impeachment de Dilma Rousseff e da posse de Temer – volta agora ao Senado numa dobradinha com o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, de quem se reaproximou diante do crescimento político do governador de São Paulo, o também tucano Geraldo Alckmin.
Nas articulações de Aécio, ele próprio disputará a Presidência em 2018, enquanto Serra pode concorrer a um novo mandato como governador de São Paulo. A Lava Jato, particularmente com as delações premiadas da Odebrecht, joga uma enorme interrogação sobre a viabilidade desses planos.
Com sua saída, o presidente Michel Temer tem agora dois cargos-chave para preencher, as Relações Exteriores e a Justiça, vaga com a ida do ministro Alexandre de Moraes para o Supremo. Isso significa uma dupla pressão sobre o presidente, que esperava emergir do carnaval com uma agenda otimista, capitalizando os sinais de recuperação da economia, mas vai ficar refém de interesses, candidatos e até nada sutis ameaças dos próprios aliados pela cobiça não mais por um, mas por dois cargos de grande influência e prestígio.
Com informações O Estado de São Paulo