Candidato da Rede Sustentabilidade à Presidência da República, Marina Silva, quando questionada sobre a descriminalização do aborto no debate entre os candidato ao Palácio do Planalto, propôs o seguinte: “O que nós queremos é que se tenha planejamento familiar e educação, para que nenhuma mulher tenha que lançar mão de uma forma tão extrema, que não é desejada. Eu defendo a forma que já está prevista na lei. Mas, se tiver que ampliar, defendo que seja feito um plebiscito escutando a população brasileira.”

Qual é o contexto

O aborto é proibido no país, de acordo com legislação de 1940. Quem provoca um aborto – a mulher ou quem a ajude – comete um crime e pode ser preso com pena de até quatro anos. A legislação permite a realização do aborto quando há risco de vida para a mulher ou quando a gestação é decorrente de estupro. Em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) ampliou o direito para grávidas de fetos sem cérebro.

No ano passado, o PSOL entrou com uma ação no STF pela descriminalização do aborto até a 12ª semana de gravidez. No início de agosto, foram realizadas sessões públicas no tribunal para discussão do tema, com a participação de vários setores da sociedade favoráveis e contrários à proposta. A ministra Rosa Weber é a relatora da ação, que ainda não tem data para ser julgado pelos ministros do Supremo.

O Ministério da Saúde estima que foram realizados entre 950 mil e 1,2 milhão de abortos ao ano no Brasil, entre 2008 e 2017. O levantamento mostra ainda que o custo com hospitalizações em decorrência de complicações causadas pelo aborto foi de R$ 486 milhões, no mesmo período.

Como a candidata vai cumprir a proposta

A assessoria da campanha de Marina Silva disse que a candidata é contra a possibilidade de que o Legislativo ou a Justiça decidam sobre a descriminalização do aborto no país. Para ela, a população tem de ser ouvida por meio de plebiscito.

O que pode ser feito

No Brasil, o presidente da República não tem a prerrogativa de convocar um plebiscito nacional, afirma o doutor em direito constitucional pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Adib Abdouni. Apenas o Congresso tem esse poder, como estabelece a Lei 9.709, de 1998. Para que os eleitores sejam chamados a opinar sobre um determinado assunto, é necessário que a proposta seja feita por, no mínimo, 171 deputados ou 27 senadores.

Além disso, o Congresso não é “obrigado” a transformar a posição vitoriosa em lei após um plebiscito, segundo Abdouni. Porém, se não fizer isso, os parlamentares assumem o risco do “custo político” na eleição seguinte e podem não ser reeleitos. Desde a Constituição de 1988, isso só ocorreu uma única vez: em 1993, quando os brasileiros foram chamados a votar sobre forma e sistema de governo (monarquia ou república e parlamentarismo ou presidencialismo).

O presidente da República pode apenas sugerir ao Congresso a convocação de um plebiscito, segundo o professor Elival da Silva Ramos, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, a Rede, partido de Marina, tem apenas dois deputados e um senador. Nesta eleição, ela fez aliança com o PV, que tem quatro deputados e um senador. Se fosse hoje, a candidata não teria força política no Legislativo para levar a proposta adiante.

O professor Silva Ramos acrescenta que, mesmo que o STF vote a favor da descriminalização do aborto até a 12ª semana de gravidez, o Poder Legislativo poderá convocar um plebiscito no futuro. E, em seguida, aprovar uma lei que corresponda à vontade popular. “Prevalece, em termos, o novo projeto de lei do Congresso”, avalia. Mas o tribunal poderá julgar se a nova legislação é constitucional ou não.

Há projetos em tramitação com essa proposta?

Nenhum projeto em tramitação no Congresso propõe um plebiscito sobre o aborto, mas há outras propostas em discussão sobre o assunto. Na Câmara, o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) é autor do projeto de lei 882, que propõe a legalização do aborto até o terceiro mês de gestação.

Em novembro de 2017, durante discussão na Câmara sobre uma emenda constitucional que visava ampliar o direito à licença-maternidade para mães de prematuros, o tema do aborto foi introduzido no projeto. O relator, deputado Jorge Mudalen (DEM-SP), acrescentou uma alteração no artigo 5º da Constituição com a introdução da expressão “inviolabilidade do direito à vida desde a concepção”.

Se essa mudança for aprovada pelo Congresso, o aborto seria proibido até para os casos que hoje são permitidos por lei. No Senado, tramita a PEC 29, de 2015, de autoria do senador Magno Malta (PR-ES), que faz as mesmas mudanças no artigo 5º da Constituição. O projeto aguarda votação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Avaliação

No Brasil, presidente da República não pode convocar plebiscito: a iniciativa tem de vir do Congresso. Além disso, o Congresso pode mudar uma lei mesmo que o presidente não queira (derrubando seu veto).

Com informações do Portal Uol Notícias