Além de confirmar a expectativa de que equacione o desequilíbrio fiscal do Estado e promova o ansiado efeito colateral de aquecer nossa letárgica economia, espera-se que a reforma previdenciária seja corrigida pelo Senado em três pontos cruciais do texto aprovado pela Câmara dos Deputados. São aspectos prejudiciais aos trabalhadores, impondo regras muito desproporcionais, sem grande impacto no resultado final em termos de economia de recursos.

O primeiro item a ser revisto diz respeito à pensão por morte. Conforme as regras ainda vigentes, os pensionistas regidos pelo atual Regime Geral de Previdência Social, relativo aos trabalhadores da iniciativa privada, têm direito a 100% do benefício que o segurado recebia, limitado ao teto do INSS (R$ 5.839,45). Hoje, no Regime Próprio de Previdência Social (setor público), o pensionista ganha 100% do benefício até o teto, mais 70% da parcela que superar esse limite.

A proposta de emenda constitucional em tramitação continua a garantir a pensão, mas a reduz de modo muito desproporcional, estabelecendo um índice de 50% do valor da aposentadoria, acrescido de 10% por dependente, até este atingir a maioridade. O montante não poderá ser menor do que o salário-mínimo em vigor. Porém, não é correto o segurado recolher em vida o equivalente a 100% e o pensionista, após sua morte, ter um retorno de apenas 50%. O problema ainda é mais grave se considerarmos que a grande maioria do universo de prejudicados é constituída por pessoas da Terceira Idade, cônjuges viúvos dos trabalhadores, que muitas vezes dependem apenas da pensão para sobreviver.

O segundo ponto a ser revisto diz respeito às alíquotas de contribuição. Estas, no caso de quem trabalha no setor público, deixam de ser fixadas em 11% e se tornam progressivas, variando de 7,5% a 22%. Na prática a alíquota máxima efetiva é de 16%. Considerando que os funcionários públicos continuam contribuindo mesmo depois de aposentados, a alíquota ficou muito alta e reduzirá de modo significativo, a partir de determinada faixa de vencimentos, o valor real dos salários.

Também seria importante rever a idade mínima para aposentadoria dos professores. No texto aprovado pelos deputados, as mulheres precisarão ter ao menos 52 anos e os homens, 55, para se enquadrar na transição, que prevê pedágio de 100%. A regra determina que os professores, de ambos os sexos, terão de pagar 100% sobre o tempo de contribuição que faltar para se aposentar quando a reforma entrar em vigor. Se faltarem dois anos, por exemplo, terão de trabalhar quatro anos. Pelas normas atuais, os professores de escolas particulares não têm idade mínima para se aposentar, mas precisam contribuir por 25 anos (mulheres) ou 30 anos (homens). Os do setor público federal têm idade mínima de 50 anos (mulheres) e 55 anos (homens), sendo 10 de serviço público e cinco no cargo.

Outra questão importante diz respeito ao risco de inclusão dos policiais militares, incluindo os integrantes do Corpo de Bombeiros, no mesmo regime das Forças Armadas, objeto de proposta específica de reforma previdenciária. Nesse caso, haveria aumento do tempo mínimo de serviço para a aposentadoria dos atuais 30 para 35 anos, para os ingressantes. Quem está na ativa, teria de pagar um pedágio de 17% sobre o tempo que falta para a reserva. Também mudaria a idade limite para a transferência à reserva, conforme o posto ou graduação na carreira. Um soldado que não consiga progredir na carreira, por exemplo, vai hoje para a reserva aos 44 anos, patamar que seria elevado para 50.

Aumentaria, ainda, o valor da contribuição. A proposta prevê a cobrança de uma alíquota de 10,5% sobre o rendimento bruto dos militares de todas as categorias: ativos, inativos, pensionistas, cabos, soldados e alunos de escolas de formação. Hoje, apenas ativos e inativos pagam uma alíquota de 7,5%. Os demais não recolhem para o pagamento de suas aposentadorias.

As mudanças são prejudiciais para grande contingente de trabalhadores. No caso do serviço público, tem o agravante de afetar uma categoria muito numerosa, que presta serviço relevante à Nação e ganha salários incompatíveis com as dificuldades e a importância de seu trabalho. Este é um exemplo emblemático de que a reforma previdenciária, cuja premência é indiscutível, não pode ser feita com o sacrifício de profissionais e medidas que ferem o senso de justiça.

*Álvaro Gradim, médico pneumologista, é o presidente da Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo (AFPESP).