Apenas no primeiro semestre deste ano, dos 12.331 habeas corpus e recursos recebidos no Superior Tribunal de Justiça (STJ), 3.506 são referentes a tráfico de drogas, ou seja, 30% do total. A informação é da presidente do órgão, ministra Laurita Vaz, ao ilustrar problemas na política de drogas no país. “O tráfico e o uso de drogas são males que têm afligido a sociedade de forma crescente nos últimos anos, que nos assusta e trazem por arrasto consequências maléficas”, disse.
A Lei nº 11.343/2006, a chamada Lei de Drogas, completa 10 anos em 2017 e para fazer um balanço da situação, a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) está promovendo, hoje (25) e amanhã (26), o seminário “10 Anos da Lei de Drogas – Resultados e perspectivas em uma visão multidisciplinar”. O evento tem apoio do STJ e da Associação dos Juízes Federais do Brasil.
Ao participar do encontro, a ministra da Advocacia-Geral da União (AGU), Grace Mendonça, disse que, do ponto de vista da segurança pública, os dados são “estarrecedores”. Ela citou dados do Departamento Penitenciário Nacional, que apontam que um terço dos encarcerados do país tiveram envolvimento com drogas. Dados do Conselho Nacional de Justiça revelam que em torno de 75% dos jovens infratores são usuários de drogas.
A resolução, segundo a ministra, exige abordagem interdisciplinar, que envolve Judiciário, saúde, ciência política e sociologia. “É importante tratar o tema na perspectiva de assistência aos dependentes, que envolve a reinserção dessa pessoa na sociedade, para que tenha qualidade de vida”, acrescentou, ressaltando que, além da reflexão, o seminário pode levantar propostas qualificadas que gerem resultados mais rápidos para a sociedade sobre a questão das drogas.
Para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a questão das drogas é dinâmica e devem ser repensados os “enfrentamentos, os efeitos, os resultados obtidos e não obtidos com a política”. Segundo Janot, há pontos prioritários a serem revistos e debatidos, como as políticas de prevenção e reinserção; a destinação de bens apreendidos para o uso no enfrentamento às drogas; a diferenciação e tratamento correto de usuários e traficantes; e o reflexo da política criminal de combate às drogas no “combalido e falido” sistema penitenciário brasileiro.
Para a presidente do STJ, ministra Laurita Vaz, a liberação do uso de drogas não é solução para os problemas que gera, pois não são consequências apenas individuais. “No Brasil, país de dimensões continentais, com grande parte da população alijada de uma educação básica de qualidade, com uma polícia cada vez mais sucateada, com órgãos de saúde pública funcionando na fronteira do caos, essa proposta me parece temerária”, disse, na abertura do seminário.
Na opinião de Laurita, é preciso pensar na realidade de forma mais ampla, buscando identificar sua verdadeira origem e trabalhar na prevenção. A educação de base, a formação para a cidadania, a promoção de atividades escolares, esportivas e lúdicas, a profissionalização e o emprego são algumas medidas que o Estado brasileiro tem deixado de empreender. “Em meio a tanta sangria dos cofres públicos, fica fácil imaginar porque o Brasil carece de investimentos em áreas essenciais; não por falta de dinheiro, mas por pura malversação do dinheiro público”, afirmou.
Além de debater a política de drogas que vem sendo adotada no país, o seminário analisa expectativas para nova abordagem do tema, como as políticas públicas voltadas à assistência de dependentes químicos, o uso medicinal de substâncias proscritas, as questões relacionadas a encarceramento e gênero, bem como aspectos penais e processuais na judicialização dos crimes previstos na Lei de Drogas.