O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação indicou, na terça-feira (16/5), o Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens, em Santana do Cariri, no Ceará, para receber o fóssil do Ubirajara jubatus — primeiro dinossauro não-aviário com estruturas semelhantes a penas encontrado na América do Sul. O artefato foi contrabandeado para a Alemanha na década de 1990 e será repatriado para o Brasil.

Ubirajara jubatus viveu há 110 milhões de anos, tinha o tamanho de uma galinha e era revestido por penas. O secretário de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Social (SEDES), Inácio Arruda, justificou a escolha do museu cearense pelo fato de que o fóssil pertence à região do Geoparque do Araripe, localizada entre estados nordestinos do Ceará, Pernambuco e Piauí —  a área é conhecida como notável centro paleontológico.

“O Ubirajara jubatus tem características bem peculiares, não encontrados antes em outros exemplares, como as estruturas das penas que os pesquisadores assemelham ao que funcionaria como a cauda do pavão. Por isso que ele, como um dinossauro em si, tem importância, além de toda a discussão associada ao decolonialismo”, explica ao Correio o diretor do Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens, Allysson Pontes Pinheiro.

cretário Inácio Arruda reforçou a necessidade de que Geoparque do Araripe ganhe mais visibilidade mundial, dada a importância científica do local. “O Museu do Cariri tem um esforço de cooperação grande”, destacou. Ainda não há uma data de repatriação, mas a expectativa é a de que o fóssil retorne ao Brasil em breve, após ser retirado ilegalmente do Ceará e ficar exposto no Museu Estadual de História Natural Karlsruhe, na Alemanha.

Segundo o reitor da Universidade Regional do Cariri, Lima Júnior, este é um bom momento para a repatriação. “Teremos a revalidação do Geoparque do Araripe, e a repatriação fortalece a missão de valor e preservação do nosso trabalho”, afirmou. O ministro-conselheiro para Assuntos Científicos e Intercâmbio Acadêmico da Embaixada da Alemanha, Christian Stertz, sugeriu a formalização do pedido para dar início ao processo o quanto antes “no âmbito da cooperação Brasil-Alemanha em Ciência e Tecnologia”.

Tráfico de fósseis

Desde 1942, os fósseis são considerados como patrimônio nacional pela legislação brasileira. Sendo assim, é proibido vendê-los. A extração depende de autorização prévia e fiscalização do Departamento Nacional da Produção Mineral e do Ministério da Agricultura. Além disso, um decreto presidencial de 1990 estabelece que a coleta de material paleontológico por estrangeiros, assim como a exportação, devem atender as normas do Departamento Nacional de Produção Mineral. A retirada de material científico deve ser feita, preferencialmente, em parceria com uma instituição nacional. Há anos, pesquisadores brasileiros reivindicam a repatriação do Ubirajara jubatus. Houve também uma mobilização no Twitter, com a hashtag #UbirajarabelongstoBR (“Ubirajara pertence ao Brasil”, em livre tradução).

Para Allysson Pontes Pinheiro, a repatriação do fóssil é uma vitória da ciência brasileira. “Vitória de todos os que se preocupam e pensam a ciência de forma ética e responsável, levando em consideração as legislações, os direitos e a identidade. Retornar à Santana do Cariri, e não a qualquer lugar do Brasil, tem outro simbolismo interno, que é a sensibilidade do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação em perceber que há assimetrias na ciência brasileira que precisam ser corrigidas. Há áreas com potencial importante para cada tema científico que devem ser valorizadas”, pontua Allysson.

O Geoparque do Araripe é reconhecido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), sendo considerado a maior bacia sedimentar do interior do Nordeste brasileiro. O local se destaca pela riqueza paleontológica, abrigando registros geológicos do período Cretáceo Inferior, entre 90 e 150 milhões de anos atrás. “Essa qualidade de fósseis atrai uma cadeia ilegal que comercializa esses organismos, independente das legislações. Essa cadeia se aproveita das fragilidades socioeconômicas que estão presentes no território. Então, para combater o tráfico de fósseis, precisamos combater a desigualdade social”, frisa o diretor do Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens.

“Enquanto isso, trabalhamos fortemente enquanto universidade, museu e geoparque com educação, para o pessoal entender, especialmente o povo do Cariri, que os fósseis têm um valor muito maior do que qualquer um que possa atribuir. Hoje, com o avanço dos programas de educação, da ação do Ministério Público Federal, da Polícia Federal e do Batalhão de Polícia Militar Ambiental conseguimos enxergar uma expressiva diminuição dessa atividade ilegal”, emendou o Allysson.