O presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (DEM), é alvo de duas multas milionárias por danos ambientais que teria cometido há oito anos em seu sítio, um terreno de 171,5 mil m² que fica em área de preservação permanente no distrito de Parelheiros, no extremo da zona sul paulistana. O vereador nega a prática e recorre das sanções na Justiça.

A Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente cobra R$ 9,1 milhões da Lesimo Sondagens e Construções Ltda., empresa dona da área, que tem Leite como um dos sócios, por ter desmatado 60,9 mil m² e feito intervenções em estradas internas e em lagos da propriedade sem autorização prévia.

Com tamanho equivalente a 18 campos de futebol, o sítio apresenta dois córregos e quatro lagos artificiais e foi adquirido pela empresa do parlamentar em um leilão público, em março de 2009, pelo valor de R$ 115 mil, após a falência da antiga proprietária, a Mencasa S/A.

O local fica em uma região duplamente protegida por ter remanescentes de Mata Atlântica: a Área de Proteção Ambiental (APA) Capivari-Monos, fiscalizada pela Prefeitura, e a Área de Proteção e Recuperação dos Mananciais da Represa do Guarapiranga, de responsabilidade do Estado. No dia 2 de setembro de 2009, seis meses após o vereador ter comprado o sítio, fiscais da Prefeitura foram vistoriar o terreno, depois de uma denúncia.

No local, encontraram “pessoas trabalhando” com uma betoneira e uma retroescavadeira, “construções de alambrado”, “pilhas de madeira”. E constataram que “algumas árvores haviam sido cortadas recentemente”, segundo relatório de fiscalização anexado ao processo, ao qual o Estado teve acesso.

O vereador, porém, não havia solicitado licenciamento ambiental para nenhuma das intervenções, que poderiam ser aprovadas ou negadas pela Prefeitura. Segundo o processo, os cortes de árvores atingiram pinus e até espécies ameaçadas de extinção, como samambaiaçu, ou xaxim, e palmito juçara.

A fiscalização resultou em três multas que, à época, somavam R$ 4,5 milhões. Leite recorreu judicialmente para tentar anular as sanções impostas pela Prefeitura, alegando que o dano ambiental foi cometido antes de ele tomar posse do terreno, o que teria ocorrido apenas em março de 2010, um ano após arrematar a área em leilão.

A Justiça, contudo, anulou apenas uma multa, de R$ 550 mil, em 2013, por entender que a infração havia sido praticada anteriormente. Mas manteve as outras duas sanções, que somam R$ 9,1 milhões em valores corrigidos. Na ocasião, o juiz Marcos Pimentel Tamassia afirmou que a alegação do vereador era “desprovida de qualquer verossimilhança”.

Leite recorreu, então, ao Tribunal de Justiça, onde sofreu nova derrota em outubro de 2014. Desembargadores da 2.ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente afirmaram na sentença que, de acordo com provas documentais, periciais e testemunhais contidas no processo, “resta incontroverso” que a empresa do vereador “já tinha a posse do imóvel” antes do registro oficial de arrematação, em março de 2010, e “nele procedia a sua ocupação”.

Satélite. Imagens de satélite mostram que, em junho de 2009, três meses após o parlamentar comprar o sítio e três meses antes da fiscalização da Prefeitura, o terreno apresentava grande mancha de desmatamento que não aparecia no registro aéreo feito pelo programa em março de 2008. Hoje, o local está quase todo recuperado e tem só uma casa de caseiro, um galinheiro e uma horta.

Na semana passada, a secretaria informou ao Estado que o processo de cobrança por dano ambiental contra a empresa de Milton Leite continua em tramitação no órgão, que já rejeitou recurso administrativo apresentado por ele. Após o término da análise, ele terá cinco dias para pagar a multa para não ser inscrito na Dívida Ativa da cidade.

“Não há que se falar em nulidade do processo administrativo, fiscalização ou mesmo sobre as autuações, uma vez que já foi apreciado pelo Poder Judiciário até em sede recursal, sendo declarada a sua legalidade”, afirmou a pasta, em nota. Segundo o órgão, Leite ainda pode assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público, se comprometendo a recuperar a área, e obter desconto de 40% sobre o valor total das multas.

‘Não cortei um galho.’ Milton Leite (DEM) afirmou que os danos ambientais flagrados pela Prefeitura de São Paulo em 2009 dentro do seu sítio, em Parelheiros, foram cometidos antes de ele tomar posse do terreno e apresentou documentos mostrando que a área já foi recuperada por ele e licenciada pela Companhia Ambiental de São Paulo (Cetesb), órgão estadual.

“Todo dano ambiental foi cometido anteriormente, pela antiga proprietária, a Mencasa, ou por terceiros. Até nós entrarmos no terreno, em 2010, e colocarmos a cerca, a área foi pilhada por todo mundo. Era gente com máquina, porque os pinus eram bons”, disse Leite.

O vereador argumenta a seu favor o fato de uma fiscalização feita pela Polícia Ambiental do Estado em 2010 ter constatado dano ambiental na área de apenas 20 m², referente à construção da cerca ao redor da propriedade, e aplicado apenas uma advertência. O sítio fica na altura do número 8.000 da Estrada da Ponte Alta, em Parelheiros.

Após a fiscalização estadual, Leite assinou um Termo de Compromisso de Recuperação Ambiental com a Cetesb em dezembro de 2013, se comprometendo a recuperar a área desmatada, plantando 4.788 mudas de espécies nativas da região, e remover os galinheiros das áreas de reserva legal, equivalente a 20% da área da propriedade. Em setembro de 2015, o órgão emitiu um alvará de licenciamento para o sítio dele.

“Não há outro sítio da região que esteja devidamente licenciado, com os lagos registrados em cartório”, afirma o vereador. “Eu não cortei um galho e recuperei toda a área desmatada por terceiros e a Prefeitura vem me cobrar multa por dano ambiental? Isso é um absurdo.”

Leite exibiu plantas do terreno e imagens de satélite antigas para mostrar que a estrada e o lago onde ele é acusado de fazer intervenções sem autorização já existiam do mesmo jeito desde a década de 1970. Ele atribuiu a multa aplicada por fiscais da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente em 2009 à perseguição política.

“A competência de fiscalização dessa área é do Estado porque tem lagos. O Município foi intromissor por maldade do fiscal, que foi multar depois de saber que a área era de um político”, afirma Leite.

Ele diz ainda ter convicção de que conseguirá anular na Justiça a cobrança. “E se nós perdemos, o que eu descarto, vou pagar só 10% da multa porque já assinei TAC com o órgão estadual, como previa a legislação à época da assinatura do acordo.” Os representantes da Mencasa não foram localizados.

Com informações O Estado de São Paulo